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from daltux

As corporações, financeiras em especial, acabam mais confundindo os usuários do que ajudando sua conscientização sobre phishing em correio eletrônico. Eis uma tentativa de explicar como foi chegar a essa conclusão:

É sabido que, ao ler uma mensagem, não convém abrir um link para domínio suspeito, ou seja, diverso daquele já conhecido do remetente. Contudo, fica consideravelente mais complicado para leigos lidarem com isso enquanto praticamente todas as mensagens reais remetidas por grandes empresas contêm rastreadores diversos. Esses rastreadores geralmente são usados no intuito de registrar, no mínimo, quem, quando, em que condições e de que origem abriu qual ligação. Pior ainda, algumas vezes essas mensagens chegam a utilizar a mesmíssima ardilosa técnica do phishing: deixam visível no texto da ligação um endereço que claramente seria institucional, quando, no fundo, ela faz referência a outro — de rastreamento. O endereço real normalmente fica oculto. Quando você aciona a ligação e acaba parando na página de destino, mesmo que esta seja correta, pode sequer ter ciência de que passou pelo rastreador intermediário, exceto se prestar atenção ao canto da tela antes de clicar. Isso, pelo menos, é mais fácil perceber em cliente de e-mail ou navegador da Web no computador, digamos, tradicional. Já quando a mensagem é lida em tornozeleira eletrônica de bolso 📱, a pessoa incauta dificilmente nota isso, a não ser que tome precauções ligeiramente mais trabalhosas.

Exemplo de trecho visível de mensagem sobre onde baixar relatórios de rendimentos:

Acesse nosso portal: https://dominioCorretoDaCorporacao.exemplo

Porém, na realidade, tecnicamente falando, a mensagem que aparece poderia ser o resultado da formatação do seguinte trecho de HTML:

Acesse nosso portal: <a href="https://track.qqcoisa.exemplo/BlaBlaBla">https://dominioCorretoDaCorporacao.exemplo</a>

Ao clicar em https://dominioCorretoDaCorporacao.exemplo e possivelmente achando que vai abri-lo diretameente, na prática saria aberto primeiro o endereço https://track.qqcoisa.com/BlaBlaBla que, sendo um rastreador “legítimo”, poderia fazer, além do registro do acesso, o redirecionamento para o tal portal.

Algumas organizações não terceirizam o rastreamento, porém, mesmo assim, realizam o embuste de exibir um endereço que vai dar em outro, ainda que em domínio da própria instituição.

Como fica a cabeça de uma pessoa sem experiência? “Devo clicar ali mesmo senão vou ficar sem a informação” ou “corre que é cilada, Bino”? É fácil dizer que deve procurar pela informação diretamente na página oficial previamente conhecida das instituições. Será que vai mesmo? E como? A probabilidade de deslizes ao consultar notórios mecanismos de busca na Web também não deve ser menosprezada.

A maneira mais segura para identificar o conteúdo ardiloso seria, provavelmente, abrir as mensagens sempre em formato de texto simples. Por que quase todos os leitores de e-mail, sejam eles dedicados ou na Web, formatam as mensagens HTML por padrão? Você sabe como configurar isso no seu? E não vai voltar atrás quando constatar que a maioria das mensagens dessas empresas fica ilegível? Elas realmente não facilitam.

O pessoal acaba ficando cada vez mais receoso com o correio eletrônico — ferramenta que, concebida e em uso há tanto tempo, embora não seja perfeita, serve bem a seus propósitos de forma descentralizada — e acha que deve se comunicar apenas por algum mensageiro instantâneo ou plataforma de publicidade direcionada privativos de liberdade na moda.

Enfim, sem as organizações que mais enviam mensagens supostamente legítimas colaborarem, o oceano de incautos para pescaria por mensagens mal intencionadas permanecerá vasto mesmo.

#phishing #infoSec #engenhariaSocial #segurança #email #golpes

 
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from drax

Cultivo

É um dia como outro qualquer na minha humilde fazenda, exceto pela tempestade que ao longe se aproxima. É noite e posso sentir minha exaustão após um longo dia de trabalho. O vento lá fora está muito forte e posso perceber que no horizonte relampeja.Vou fechar as portas e janelas e aguardar a tempestade passar. Um ensurdecedor estrondo me surpreende, aparentemente, um raio caiu bem no meu quintal. Agora a escuridão me cerca e eu me encolho na cama rezando para esse caos passar… E sem perceber, eu apago, um novo dia nasceu. Hora de avaliar os danos, parecem bem menores do que o esperado. Um ou outro galho caído e no meio do quintal, uma marca, deve ser o ponto onde o raio atingiu. Por mais que tenha deixado um largo círculo de grama queimada no chão, estranhamente, não gerou um incêndio e a parte mais estranha de tudo isso é que bem no centro desse círculo uma pequena planta nasceu. Sim, eu sei que é de se estranhar esse fenômeno, mas acima de tudo a misteriosa planta me fascinou, decido cultivá-la. Uma semana se passou, a planta parece com muita saúde, todo dia tenho ido regá-la e ela já se estruturou em um caule de uns 20 cm. Mas algo está me incomodando, parece que as minhas atividades rotineiras que tanto me acostumei estão me cansando mais do que o normal. É algo sutil, porém notável. Faz um mês que eu ritualmente cuido da planta, agora ela se ergueu como uma vistosa pequena árvore de não mais que 1 m. Meu cansaço aumentou significativamente a ponto que passei a deixar algumas tarefas de lado, mas não consigo deixar de cuidar dela. A planta está se tornando uma prioridade na minha vida. Três meses… Meus animais definham, minhas plantações morrem, minha casa está um caos… E eu… Estou sem energia. Mas a planta está bem! Isso é o que importa! Minha mente não funciona mais... Cansaço e fome me tomam… Mas, tenho que terminar de cultivar a planta. Eu abro a porta para o quintal enquanto sinto minha vida se esvair... Eu a vejo, ela deve ter… 1,60… Minha altura… He he… Agora que parei para pensar, essa é uma planta estranha… Da raiz saem dois caules que mais se parecem pernas e estes se juntam num… Tronco? Do tronco saem dois galhos… São braços? E então, no topo, o que parece ser uma cabeça. Me aproximo… A lentos passos me arrasto para aquela que tenho dedicado meus últimos meses… Ela não só parece ter um corpo humano… Altura, proporções e até mesmo as feições do estranho rosto de madeira e folhagens se pareciam… Comigo? A planta começa a mexer… Ela move suas pernas... Erguendo-as da terra... E se cortando de suas raízes… Minha visão está embaçando… Sinto minha vida se afastando de mim… Respiração pesada… Minhas pernas não mais me sustentam e caio de joelhos no chão… Eu olho para cima enquanto ela se aproxima… Ela se inclina na minha direção… Agora não parece mais de madeira nem mesmo é verde… Uma perfeita cópia minha… E então ela suspira nos meus ouvidos as últimas palavras que irei ouvir na minha existência… — Agradeço pela minha vida.

 
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from Felipe Siles

O fenômeno que vou narrar não é novo, o historiador José Ramos Tinhorão já aponta há muito tempo a identificação da classe média brasileira com a classe média dos Estados Unidos, e a não identificação com a classe popular do Brasil. Segundo a crítica de Tinhorão, presente em diversos de seus livros, essa identificação cultural da classe média com o americano — que se dava principalmente na música (o jazz), no cinema e no vestuário — culminou na Bossa Nova. Porém, a reflexão que eu tento fazer aqui se dá em cima de processo semelhante, mas que foi por mim presenciado no início dos anos 2000: a popularização das séries americanas aqui no Brasil.

Eram os anos 2000, início do governo Lula 1, os Estados Unidos foram abalados pelo atentado terrorista do 11 de setembro de 2001 e, apesar do arranhão, pelo menos naquele momento ainda permaneciam no topo do mundo. No Brasil, por uma série de fatores, começou o processo de grande mobilidade social, levando ao inchaço da classe média no país. Quem vive no Brasil sabe, acho que nem a Judith Butler é capaz de imaginar que por aqui a classe social não é só questão de patrimônio, mas também de performance. A classe popular faz tudo para parecer a classe média, a classe média emula comportamentos da classe dominante, e a classe dominante jura que é pobre, que não é tão privilegiada assim... como dizem, isso aqui não é para amadores.

Essa performance de classe social ocupa o nosso imaginário de uma forma que a gente nem se dá conta direito. Eu, que sou oriundo das classes populares, me lembro que desde criança minha mãe vivia me enchendo a paciência com a questão da aparência: não pode andar na rua de chinelo e bermuda, precisa cortar o cabelo (o cabelo não pode em hipótese nenhuma ficar armado, estilo black), até pra ir no mercado precisa se arrumar.

No Brasil do Lula 1 as placas tectônicas das classes sociais começaram a se mover, e a classe média, que passou a ter os seus ambientes frequentados agora também pelas classes populares (aeroporto, rolezinhos no shopping, etc), precisava se distinguir dos subalternos, no aspecto cultural, o que também não é nada novo (até mesmo antes da Revolução Francesa, os nobres ameaçados pela burguesia que ascendia se diferenciavam pelo gosto artístico). O cinema e a música já não davam mais conta de diferenciar tanto assim as duas classes, já que ambas consumiam mais ou menos os mesmos produtos: a classe média ia no cinema, a classe popular assistia o mesmo filme quando passava na Tela Quente; a classe média comprava CDs, a classe popular ouvia as mesmas músicas no rádio ou em fitas K7. E é nessa mesma época que começou a se popularizar um tipo de entretenimento: a TV à cabo.

É seguro dizer que, nessa época, o principal entretenimento das classes populares era a televisão aberta: novelas, futebol, Jornal Nacional, Silvio Santos, etc. E a classe média, com TV à cabo, gostava de Friends, Two and Half Man, House, Lost. A classe popular consumia as séries americanas só quando passavam dubladas na tv aberta: Todo mundo odeia o Chris é um bom exemplo. Eu me lembro bem do estranhamento que tive, pois a partir do meu ingresso em universidade pública em 2003, passei a conviver com esses dois mundos. Na minha casa a gente assistia Kubanacan e Domingo Legal (assim como na casa de meus amigos do Ensino Médio), já meus amigos de faculdade assistiam Law and Order.

E a classe média, ameaçada pela classe popular ascendente, fazia questão de reforçar esses limites, adquirindo produtos das suas séries preferidas: livros, canecas, camisetas, etc. Conversavam entre eles sobre as tais séries, deixando quem não acompanha esse mundo boiando na conversa. Desenvolviam piadas e compartilhavam referências entre eles: “ah, isso é tão fulaninho do Friends” (p.s.: não sei o nome de nenhum personagem dessa série), também com o objetivo de se diferenciar do pobre, que assistia Ratinho e Ana Maria Braga.

Assim como aconteceu com a música e o cinema, esse consumo de séries hoje se massificou, e não é mais possível diferenciar as classes sociais no Brasil pelos produtos culturais que elas consomem, já que todas consomem os mesmos produtos. Essa massificação deve-se a inúmeros fatores: a TV à cabo que cada mais se popularizou, a chegada do streaming, e das redes antissociais com seus famigerados algoritmos.

Porém, você lembra que o Brasil é o lugar onde o pobre quer parecer a classe média, a classe média quer parecer o rico, e o rico quer parecer o pobre, né? Pois é... O rico pode viajar para os Estados Unidos praticamente a hora que quiser, a classe média não necessariamente, precisa planejar bem a viagem. E essas séries trouxeram uma familiaridade com a cultura, o jeito de pensar e até com a geografia dos Estados Unidos. Sentiram-se contemplados, porque na performance da classe média em parecer classe alta, esse conhecimento pode até fazer com que pareça que eles conhecem a terra do Tio Sam, como se viajassem para lá o tempo todo.

O pobre, assim que teve acesso a esse produto cultural, passou a consumi-lo para performar uma imagem de classe média. Diferente do filme, a série está ali contigo o tempo todo, uma vez por semana, todo dia, depende, mas é uma presença constante, é diferente do filme onde você fica exposto às ideias americanas por duas horas e depois volta pra Banheira do Gugu e pras Videocassetadas. E o povão, que tinha seu imaginário de desejos povoado pela novela das oito, passou a desejar o sonho americano, aquele american way of life. Tanto classe média como classe popular sonham com a mobilidade e ascenção social, e agora ambos buscam essa ascenção através da mesma bússola, que é esse estilo de vida americano, o que também ajuda a explicar o fenômeno do empreendedorismo e a praga dos coachs.

Pouca gente no Brasil conseguiu capitalizar e organizar esse desejo e esse imaginário como a extrema direita, até os dias de hoje inclusive. A babação de ovo para o Trump, o Bolsonaro batendo continência para a bandeira dos Estados Unidos, liberação do porte de armas, importação de movimento antivax, vocabulário coach, tudo isso mexe com o desejo de mobilidade social do povo, que a partir do consumo das séries se organizou e se alinhou ao american way of life. No senso comum do povão, tudo que venha dos Estados Unidos é melhor, sentimento que é muito bem ilustrado pelo personagem Renan do Choque de Cultura. Esse sentimento já existia por conta de Hollywood, mas foi aprofundado com o consumo das séries.

Lógico que as séries sozinhas não são responsáveis pela ascenção do facismo brasileiro, há também a contribuição dos jogos de videogame, filmes, música, comida ultraprocessada e outros produtos culturais. Mas pude ver de perto, o quanto essas séries foram utilizadas como marcador de classe social, na medida que falar mal ou simplesmente dizer que não liga para How I meet your mother ou Orange is new black é como ofender a mãe de algumas pessoas, porque faz a pessoa lembrar que a fronteira entre classe popular e classe média é mais frágil que a masculinidade, o que faz essa pessoa ir correndo para o Starbucks tomar um café meia boca e continuar no auto-engano.

E até hoje, mesmo dentro do campo progressista, eu consigo sacar a origem social de pessoas da minha geração facilmente pelas suas referências culturais. As minhas referências de anos 2000 estavam a maioria na TV aberta, no máximo na MTV, que pegava na TV aberta em alguns lugares. Eu sou capaz de reconhecer infinitos jogadores de futebol, mas devo saber no máximo o nome de uns trinta atores dos Estados Unidos. Vai ver que é por perceber esse fenômeno que eu até hoje não tenho a menor boa vontade com séries, não acompanho quase nenhuma, com poucas exceções. E também porque são muito grandes, tenho mais o que fazer...

 
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from Lento, pero escrevo

A tentação no terror e na política

Se pararmos pra pensar, a tentação, passar vontade, não é condenável. Mas diziam que são sete pecados capitais: a gula, luxúria, vaidade, orgulho, raiva e mais uns outros tantos.

Mas querer comer mais um pouco é condenado? Os mandamentos católicos apostólicos romanos indicam que querer se amostrar, cogitar em se orgulhar, pensar em transar, sentir tesão leva a gente pro tormento eterno no colinho do capeta?

Não faço a menor ideia da resposta biblicamente correta disso aí. Nunca li a bíblia por inteira, por que peguei canseira das missas católicas de domingo depois de pegar bicho do pé na Igreja. Apesar disso, esse monte de pertubação de juízo católica fez morada na minha cabeça. A culpa e a autoindulgência sempre tiveram seu lugarzinho aqui. Mas esses tempos me peguei pensando muito na tentação.

Pertubação de juízo, passar vontade. Talvez essa seja uma forma boa de olhar pra tentação. Aquela voz baixinha de desenho animado que não te dá paz, sobrevoando teu ombro, aquele pensamento intrusivo de fazer uma parada que talvez tu saiba que não possa.

Na política, a extrema-direita morre da tentação: tu não pode ter o menor contato com um mínimo de solidariedade que corre o risco de virar “comunista”. Tinha aquela história, que aparece no filme do ex-presidente Mujica preso na ditadura Uruguaia (eu acho), de que os milico tinham medo que os guerrilheiros convencessem até os torturadores e os convertessem no pecado de ser revolucionário, tamanha era a lábia que imaginavam que a galera tinha.

Mihakil Bakunin, anarquista russo das antigas e anticlerical, escreveu um texto chamado “CATECISMO REVOLUCIONÁRIO”. Teria ele, um ateu anticlerical, sofrido tentação da disciplina da Igreja para pensar a organização política que colocaria o capital abaixo? Provavelmente não. Mas todo o texto “Deus e o Estado”, sua crítica ao idealismo parte da noção de que se um iluminado tenta organizar a vida dos outros com ideias única e exclusivamente do seu cu da sua cabeça certamente vai terminar brutalizando a vida, como foram as Igrejas católicas, o Estado e o capitalismo. De toda forma, ele se “suja” de tudo que critica para, enfim, fazer sua crítica.

Ver a tentação como algo positivo talvez possa ser nada mais do que uma forma de sentimento de lidarmos com a contradição e a encararmos, superar a curiosidade e se situar no mundo.

Na ficção, os filmes de terror a tentação é um sentimento de lei. Vampiros são esses seres: sedutores, mas violentos, apropriados em algumas histórias pra questionar as hierarquias sociais, o racismo e a LGBTfobia (o patriarcado depende), mas moralmente questionáveis. Sentem uma vontade incontrolável de sangue e de seduzir homens e mulheres por esporte (e fome), mas também deslocados da sociedade e injustiçados. Eles encarnam um bom exemplo de tentação.

Os filmes e histórias de terror são vários e infinitos, mas sempre me questionei o por quê de termos tanta curiosidade com essas histórias. Seria a tentação de ver o diferente? De ver uma pertubação na ordem conservadora dos vários contos de terror com monstruosidades? Por que ver algo que nos dá medo? É pela adrenalina?

Não tenho as respostas disso. Mas foram pensamentos que me passaram nos últimos meses, vivenciando a volta de uma extrema-direita fascista no mundo enquanto leio e assisto histórias de vampiros como a série Entrevista com um Vampiro, os animes Vampire Hunter D: Bloodlust, mangás de horror do Junji Ito com incômodos mundanos levados ao absurdo e lendo contos de terror paraenses de Tanto Tupiassu no livro Dois Mortos e a Morte.

Como a tentação pode ser cultivada na política revolucionária? Como a tentação pode ser cultivada na superação definitiva do capital, do racismo e do patriarcado? Não tenho certeza, mas se para os capitalistas reacionários que organizam nossas vidas ser tentado é um problema, talvez haja um ponto aqui. Recentemente traduzida no Brasil, no livro Multidões e partido a comunista Jodi Dean incorpora um debate anarquista e autonomista e nos traz a importância da solidariedade enquanto um sentimento central na organização política comunista, por que só ela seria capaz de romper com esta ordem das coisas que bota cada um pra pensar no seu próprio umbigo, o individualismo burguês. Só a solidariedade rompe barreiras policiais que impedem um ato contra aumentos de tarifa de andar, impede um despejo de uma ocupação de prédios da especulação imobiliária ou produz comida de forma igualitária e sem veneno. Só a solidariedade cria um mundo novo.

Talvez devêssemos cultivar, junto dela, da tentação. Se os conservadores e reacionários nos dizem diariamente que essa vida é ruim, é realmente bruta, viril e violenta, “só os fortes sobrevivem”, em lugar dessa barbaridade devemos cultivar a tentação pela vida, pela solidariedade, igualdade e liberdade. Instingar e incomodar com a tentação de que a vida pode ser melhor, mais leve e menos bruta . Lembrar isso junto aos nossos e aos de baixo que foram seduzidos por ideias reacionárias é uma forma de desatar o nó entre as classes populares e o fascismo.

Fim deste rascunho e ideias jogadas ao ar.

 
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from daltux

Avatar do F-DroidFui instigado por uma publicação no Mastodon que pergunta:

Que apps vcs usam do fdroid?

Como a resposta não coube em 500 caracteres, resolvi redigir, aqui, uma lista com aplicativos que tenho utilizado na tornozeleira eletrônica de bolso Android, instalados com o F-Droid (conheça), sejam eles provenientes do repositório padrão, sejam do repositório IzzyOnDroid ou de outros a serem citados. Todos são software livre, regidos por diversas licenças assim consideradas, embora às vezes possam ainda ter dependências não-livres, conforme eventuais observações na página de cada pacote. Tento ainda indicar para que servem, com o mínimo de palavras.

  • Aegis Authenticator – segundo fator de autenticação (2FA) nos padrões TOTP e HOTP
  • AntennaPodpodcasts
  • Autu Mandu (IzzyOnDroid) – gestão de gastos de automóvel
  • BreezyWeather (IzzyOnDroid | F-Droid) – previsão do tempo altamente personalizada, podendo escolher fontes de dados meteorológicos diferentes para determinadas funções
  • Commons – envio de imagens e edição de metadados para Wikimedia Commons
  • DAVx⁵ (IzzyOnDroid) – sincronização de agendas (CalDAV) e contatos (CardDAV). Utilizo com Nextcloud.
  • Download Navi – gerenciador de baixação de arquivos com maior controle
  • Etar – agenda
  • Fedilab – cliente para redes sociais federadas Mastodon, Pleroma, Pixelfed, PeerTube, GNU Social, Friendica e variantes
  • HeliBoard – teclado
  • Imagepipe – remove metadados Exif e reduz tamanho de imagem antes de compartilhá-la
  • Jerboa – cliente Lemmy (Ayom Fórum)
  • Jitsi Meet – videoconferência
  • K-9 Mail – cliente de correio eletrônico, utilizado para múltiplas contas
  • KeePassDX – gestor de senhas. Sincronizo com Syncthing.
  • KingInstaller (IzzyOnDroid) – instala aplicativo marcando-o como se tivesse sido instalado por Play Store, a fim de tentar contornar restrições
  • Librera Reader – leitor de e-book
  • Logseq – gestão de conhecimento. Utilizo para anotações em tópicos, utilizando Markdown. Sincronizo com Syncthing.
  • Metrolist (IzzyOnDroid), reprodutor de música da “nuvem” (YouToba Music).
  • Monocles chat – mensagens e chamadas individuais e em grupo (XMPP)
  • Mull – navegador Web compilado a partir do código-fonte do Firefox, porém com mais privacidade e remoção de blobs
    • Projeto descontinuado em 2025. A equipe F-Droid sugere Fennec em seu lugar.
    • Navegadores “amigos da privacidade” podem ser obtidos também pelo FFUpdater
  • NewPipe – cliente leve para PeerTube, YouToba e outros.
  • Nextcloud – acesso a arquivos de Nextcloud
  • Nextcloud Talk – mensagens e videoconferência integrada a Nextcloud
  • ntfy – cliente de serviço de notificações push de inúmeras fontes, até por cURL
  • Obtainium – obter/atualizar alguns aplicativos diretamente dos desenvolvedores.
  • OpenKeychain: Easy PGP – criptografia no padrão OpenPGP, podendo ser usado por K-9 Mail, entre outros
  • openScale – gestor do “peso” e de outras métricas corporais
  • Organic Maps – navegação (“GPS”) leve com mapas baixados mensalmente do OpenStreetMap
  • OsmAnd~ – navegação (“GPS”) extremamente minuciosa com mapas baixados mensalmente do OpenStreetMap, opcionalmente podendo ser atualizados a cada hora. Indispensável a quem colabora com o mapa.
  • OSS Document Scanner (IzzyOnDroid) – digitalização de documentos físicos com a câmera da tornozeleira eletrônica de bolso
  • Pano Scrobbler (repositório F-Droid do próprio desenvolvedor) – envia músicas ouvidas nos aplicativos do aparelho para serviços do gênero – utilizo com ListenBrainz
    • Também pode ser instalado pelo Obtainium
  • PeerTube – cliente para a rede fediversal de vídeo desenvolvido oficialmente por FramaSoft
  • RiMusic – cliente leve de YouToba Music
    • Projeto abandonado/desconfigurado em março/2025, sucedido por Kreate, que ainda não testei. Tenho usado Metrolist, embora ainda não tenha testado nas mesmas condições a seguir.
    • Costumava baixar o apk do GitHub (com Download Navi) e instalar com KingInstaller, manobra lamentavelmente necessária para que o aplicativo fosse reconhecido por Android Auto e, assim, utilizável no aparelho embutido no carro.
  • RustDesk – acesso remoto a ambiente gráfico
  • SalvarEm – permite salvar em qualquer diretório um arquivo compartilhado por qualquer aplicativo
  • SatStat – dados de localização por satélites, bússola, rede celular, WiFi e outros sensores do aparelho
  • SCEE – versão um pouco mais avançada de Street Complete, app para facilmente ajudar a melhorar o OpenStreetMap
  • Syncthing-Fork – cliente do Syncthing, para sincronizar diretórios entre seus dispositivos, sem necessitar de “nuvens”
  • Termux – distribuição GNU dentro do Android com Bash e gerenciamento de pacotes similar ao APT do Debian.
  • Translate You – tradutor
  • VLC – tocador de praticamente qualquer arquivo de mídia. Utilizo com o diretório de músicas locais sincronizadas por Syncthing
  • WiFiAnalyzer – mostra metadados das redes WiFi

Atualizações

  • 2025-01-08
    • Mull/Fennec/FFUpdater e RustDesk, após informe da equipe F-Droid.
    • K-9 Mail, que tinha incrivelmente faltado na lista, bem como OpenKeychain, usados em conjunto, aqui instalados dentro de dita “Pasta Segura” do dispositivo.
  • 2025-06-13
    • Correção da data anterior
    • RiMusic encerrado; entram Metrolist, PeerTube

Descrição da imagem no início

É o ícone do projeto F-Droid, uma figura em formato que lembra um robô com cabeça verde e corpo azul, retangulares, sem membros. A cabeça, mais achatada, possui dois olhos circulares brancos e de suas extremidades superiores saem duas antenas curtas, também verdes. O corpo ostenta, em azul mais escuro, uma letra C invertida, contida num círculo, o que representa a ideia de Copyleft.

The F-Droid logo – Copyright 2012 William Theaker, 2013 Robert Martinez, 2015 Andrew Nayenko – CC-BY-SA 3.0 Unported || GPLv3+

 
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from Felipe Siles

Esse é um texto bem com cara de final de ano. Afinal, vem o recesso e a maioria dos trabalhadores pode ter um pouco mais de tempo livre, descanso e muitos aproveitam para fazer andar a fila de filmes e séries. Não sou diferente, e apesar de ainda estar trabalhando, por conta da minha vida de profissional autônomo, tenho utilizado essa quebra na minha rotina normal para fazer testes, reflexões, consolidações e ajustes na maneira como eu escolho meu entretenimento audiovisual.

Mas Siles, que chatice! Precisa ser organizado até nisso? Não é só sentar na TV, relaxar e assistir o que quiser? Pode ser, se funciona assim pra você, ótimo! Mas eu acho que se a gente não precisasse de curadoria, não haveriam algoritmos de streamings e redes sociais nos entupindo de sugestões de filmes e séries. Quem conhece bem este blogue, já sacou que eu sou bem avesso a esses algoritmos e sua propaganda, acredito que cada sujeito ou grupo social deveria exercitar investigar o que realmente gosta de consumir, procurando se alienar dessa publicidade (na medida do possível) com o objetivo de auto-conhecimento, auto-descoberta e qualidade de vida, que realmente nos faça descansar do trabalho, e não gere ainda mais ansiedade. Fazendo um paralelo com alimentação, nunca vi propaganda na televisão de alimentos orgânicos, mas apesar disso eles são a parte principal da minha alimentação há muitos anos.

No sentido de evitar a ansiedade, eu sigo alguns princípios, que funcionam para mim. Podem não funcionar para você, mas isso aqui não é um guia ou manual da coisa certa a se fazer, apenas um relato pessoal da experiência que funciona para mim, e aproveite o quanto esse relato for útil para você. Minhas regras, por um entretenimento menos ansioso, são:

  • Prefiro me alienar de lançamentos e de hypes, com exceção de quando tenho a oportunidade de ir ao cinema, porque aí vou inevitavelmente assistir algo que está em cartaz. Mas dentro da minha casa, na frente da minha televisão, tento ao máximo ignorar o que todo mundo tá vendo, afinal sou um radical daquela regra da mamãe: “você não é todo mundo”;
  • Proibido mexer no celular ou em qualquer aparelho digital enquanto assisto um filme, série, etc;
  • O horário de televisão, assim como sua duração é pré estabelecido dentro da minha rotina;
  • Menos é mais, melhor ver poucas coisas e se divertir com elas do que tentar dar conta de várias e ficar perdido, ansioso e entediado, ou ficar criando listas e metas intermináveis e depois lidar com auto-cobrança.

A última regra e uma opinião muito impopular: pessoalmente, evito as séries. Na minha opinião elas são produtos meramente comerciais e sua explosão e popularização só se justifica na necessidade dos serviços de streaming demandarem produtos que vão prender o usuário na assinatura. No meu caso, um trabalhador com tempo livre escasso, as séries além de consumir muito tempo livre, ainda geram um nível de ansiedade, já que elas são produzidas para viciar e provocar a maratona. E sou uma pessoa que valoriza a rotina, as 8 horas de sono, as refeições no horário correto (as minhas costumam ser acompanhadas de um podcast), então dispenso esse formato de entretenimento. E tem uma pitada de old school e saudosismo também, ainda acho que a sétima arte, o cinema, os filmes, ainda é uma forma de entretenimento superior, seja lá o que isso queira dizer.

Substituto as séries por animes, que em geral são ótimos produtos culturais, com duração bem mais curta dos episódios. Enquanto uma série em geral tem episódios de cerca de 1 hora, um anime dificilmente chega a 30 minutos. Ou seja, ao invés de assistir dois episódios de uma série, eu prefiro assistir um filme (ou seja, uma história com começo, meio e fim, pelo menos assim espero rs), ou então 4 episódios de anime (animes diferentes, ou o mesmo anime, se eu estiver maratonando).

Outro detalhe interessante, com essa coisa de diversos streamings irem reduzindo o compartilhamento de assinaturas, fui deixando diversos serviços e atualmente assino apenas dois, que me contemplam bem (Max e Telecine), e compartilho a senha do Crunchyroll, assinado pelo meu irmão. Para as coisas que eu gosto de assistir essas assinaturas são suficientes. E se tiver algum produto cultural que eu queira muito ver, que esteja em outro serviços, sempre existem meios de assistir, se é que você me entende...

Contextualizado o meu gosto pessoal, minhas regras, vamos a como eu monto a minha curadoria:

  • Animes: acabo escolhendo por recomendações de amigos mesmo, esse é um assunto que eu sempre converso em determinadas rodas de amizades. Gosto de acompanhar alguns que ainda estão sendo produzidos, assistindo semanalmente o episódio novo. Gosto muito mais dessa forma de consumir do que as maratonas, acho mais gostoso e menos ansioso assistir desse jeito. Mas não posso negar que às vezes gosto de maratonar um anime, quando ele me pega muito. Vou acompanhando esses que estão sendo produzidos na atualidade uma vez por semana, e também pego um mais “antigo” para ir assistindo aos poucos. Esse “antigo” eu gosto de pegar bem os clássicos mesmo, consagrados pelo gênero e assisto um de cada vez, no máximo dois, não gosto de conciliar vários. Outra coisa, eu evito deixar a “lista de favoritos” muito grande, deixo só os novos que estou acompanhando, e o(s) “antigo(s)”, e quando termino de ver o(s) “antigo(s)”, tiro ele da lista. Atualmente estou considerando como ideal assistir no máximo 4 episódios de anime por dia, e se for futuramente mexer nesse número será para diminuir, e não aumentar;

  • Filmes: eu odeio aquela sensação de indecisão ao escolher um filme. Então já salvo vários que quero assistir na famosa “minha lista” e gosto de definir algum critério para a sequência que vou assistir. Exemplos: todos os filmes do Studio Ghibli (ou de outro estúdio), todos os filmes do Spike Lee (ou de outro diretor), filmes biográficos, filmes com um ator específico, filmes de um gênero específico, todos os filmes de uma trilogia ou coleção, etc. Esse tipo de critério ajuda muito na escolha do filme que vou assistir, já que a escolha é um processo cansativo para o cérebro e a ideia é relaxar e se divertir. E é legal que você fica no clima de um determinado tipo de filme. Por exemplo, assisti na sequência filmes biográficos sobre Pixinguinha e Elis Regina, foi uma experiência interessante e acabei traçando mentalmente diversos paralelos entre essas duas produções. Se nos animes eu evito a “minha lista” muito longa, aqui vou simplesmente adicionando tudo que quero ver, sem muito filtro, mas também não me cobro pra ver tudo num prazo específico, apenas penso nesse monte de filme como se fosse a minha locadora pessoal (essa só o pessoal dos anos 1980 e 1990 vai pegar a referência kkkk).

Outra coisa que acho legal é produzir um registro das coisas que assisto. Tenho utilizado as plataformas Justwatch e Letterboxd para isso. E elas também são muito úteis para descobrir em qual serviço de streaming está algum produto cultural que eu queira ver. Se você quiser me seguir no Letterboxd.

Mais uma coisa: eu não sou dessas pessoas que acha que todo entretenimento tem que ser “cult”, tem que levar à reflexão, etc. tem horas que eu amo assistir um filme de porrada para desligar o cérebro mesmo, viva o escapismo! Mas trocar a realidade dura de trabalhador no capitalismo tardio por um entretenimento raso 100% do tempo, é algo que eu evito também, então tento minimamente equilibrar. Normalmente eu gosto de assistir as coisas mais rasas durante a semana, depois de um dia cansativo de trabalho e deixar a arte mais profunda, “cult”, nobre, etc para os feriados e finais de semana.

Última coisa, prometo: não precisamos ocupar todo o tempo livre também, com filmes, séries, leituras, podcasts, músicas, passeios... o ócio também faz parte da vida, e lidar com ele tem sido um desafio na conteporaneidade, mas penso que valha a pena encará-lo, em nome de uma vida melhor.

Bom descanso, e bom entretenimento!

 
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from yuribravos

Eu dirijo há mais de uma década. Nunca me envolvi em nenhum acidente sério, embora tenha tido uma ou outra batida de leve, sem danos além dos materiais.

Tirei a carteira de moto depois que casei, pois só tinha uma vaga e não cabiam dois carros. A primeira coisa que me deixou abismado com a motoescola é o fato — completamente aberrante, mas encarado como normal — de não ter aulas práticas no trânsito.

Tudo que te ensinam é se equilibrar sobre a moto e andar na primeira marcha. Nem ensinam a passar as marchas. Isso fica para o motociclista descobrir sozinho no meio da rua. Daí entendi porque há tantos motociclistas que dirigem de forma imprudente e sem noção: eles não foram ensinados a trafegar no meio de outros veículos.

Dito isso, eu já tinha mais de dez anos de prática no volante quando tirei a carteira de moto, então sempre dirigi de forma prudente. De forma correta. Até que, outro dia, tentaram me matar.


Eu também ando de bicicleta. Já andei mais. Por duas vezes fui derrubado por motoristas de carro que ignoraram qualquer regra básica de trânsito como preferênciais. Um deles fugiu, a outra se comprometeu a pagar pelo menos o conserto da minha bicicleta. Em ambos os casos a coisa me pareceu mais desatenção que qualquer outra coisa.

Uma desatenção, é óbvio, pavimentada sobre a percepção que a rua pertence aos carros e que, portanto, tudo mais deve parar e esperar que façam o que bem entenderem.

Nenhuma desculpa para o carrocentrismo das nossas vias urbanas.


Voltava do meu treino, pelo caminho que sempre faço. Tinha passado no mercado pra comprar algo para preparar a janta. No meu caminho, eu dobro à esquerda num entroncamento entre duas avenidas. A pista da direita também é bem comprometida, o que me faz, normalmente, seguir na pista da esquerda por 4 ou 5 quarteirões antes de dobrar no tal entroncamento.

O que não deveria ser um problema, já que vou rodando na velocidade máxima da via, 50km/h. Idealmente ninguém deveria fazer ultrapassagens se seguimos na velocidade máxima. Ainda mais depois das 20h, quando sequer tem trânsito pesado.

Pois bem, nesse dia eu seguia na faixa da esquerda, faltavam 3 quarteirões para virar. Notei, pelo retrovisor, um carro vindo em alta velocidade. Deu sinal de luz, buzinou. Fiz um gesto para que ele seguisse pela direita que estava completamente livre, afinal, logo mais eu iria virar à esquerda.

O motorista assim o fez, mas jogou o carro para cima de mim. Não passou perto o bastante para ser um problema. Não acelerei, apesar de tê-lo xingado mentalmente, e deixei o infeliz seguir seu caminho. Não fiz qualquer gesto agressivo.

Acontece que, como todos sabemos, correr é um auto-engano. Quando chegou no sinal do entroncamento e eu segui para o espaço de espera dos motociclistas, que fica à frente dos carros, acabei passando esse mesmo motorista, que esperava na fila da esquerda. Não fiz nenhum gesto, não alterei a velocidade, apenas segui meu caminho. Parei no mesmo sinal que ele.

O assassino saiu da fila, passou para a direita, parou o carro do meu lado. Baixou o vidro e começou a gritar sobre como eu precisava aprender a dirigir. Não respondi nada, não esbocei reações. O sinal abriu. Saí com minha moto. E pela segunda vez o assassino jogou o carro para cima de mim, dessa vez, encostando.

A sorte é que estava em baixa velocidade. Não cheguei a cair, embora tenha danificado minha moto. Ele fugiu, certo da impunidade.

Fiquei incrédulo. Respirei fundo. A moto ainda funcionava. Segui para casa. Botei uma braçadeira pra segurar a carenagem da moto enquanto não consertava. Registrei um boletim de ocorrência. No dia seguinte, fui à autarquia municipal de trânsito solicitar as filmagens das câmeras. Pois, talvez ele não sabia, mas aquele cruzamento é videomonitorado 24h. Abri o processo de solicitação e aguardei. Quase vinte dias depois, recebi as filmagens.

Infelizmente as instituições não funcionaram: as filmagens pegam exatamente o momento, mas é impossível identificar a placa do carro. A qualidade da imagem é péssima para esse tipo de detalhe.

Ainda assim, se você souber maneiras de melhorar a nitidez de uma filmagem de forma quase mágica, estou aberto a sugestões.


Depois disso, pela primeira vez na vida — as benesses das minhas circunstâncias — fiquei receoso de me locomover na cidade. Pois é evidente que aquele motorista queria me matar. Ele não tinha nenhum motivo para isso, mas queria.

Outro dia, voltando do trabalho 17h, vi uma outra pessoa com um carro grande — evidentemente — dirigindo numa velocidade absurda para as vias coletoras que faziam aquele caminho. O trânsito nem estava caótico, seguia normal. Mas a pessoa dirigia com clara sede de sangue. Quem ela queria matar?

Não sei. Espero que não seja eu, que fiz tudo direitinho, sem fazer mal a ninguém, e ainda assim, virei alvo de matador.

 
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Tags: #Militância #Pessoal #Neurodivergência

Introdução

Faz 4 meses que abandonei a Força Esperança. Nesse período passei por um mergulho em profunda depressão, mas hoje, estando em clara tendência de deixar os dias assustadores para trás, posso reavaliar a minha relação com a FE.

Não sabe o que é a Força Esperança? Leia meu texto Desfiliação.

Esse texto é um resgate de coisas que já falei antes, mas com um olhar mais analítico permitido pela maior tranquilidade emocional, afim de processar o que ocorreu comigo. Na última seção vou além do retorno ao passado e traço caminhos para o futuro. Tenha em mente que esse ainda assim é um relato subjetivo, que não leva em consideração as versões das diferentes pessoas envolvidas.

Começo

Começando do começo, eu vinha tratando um quadro depressivo-ansioso desde o começo de 2021, fruto da pressão no trabalho, mas com remédio e terapia estava estável. Mesmo com esse suporte, eu adoeci pra valer em 2023. O diagnóstico oficial foi de transtorno misto ansioso e depressivo (F41.2) combinado com esgotamento (Z73.0). Na época, o esgotamento parecia se sobressair. Eu estava exausta para tudo. Pensei que nunca mais fosse conseguir voltar a trabalhar com o rendimento que eu antes tinha. E, passado mais de 1 ano deste colapso, apesar de grande melhora, posso dizer que ainda não recuperei a energia e estabilidade que eu tinha antes.

Necessário pontuar que a piora do meu quadro coincidiu com o momento em que passei a ser contabilizada para a cota PcD no trabalho, e discriminada como tal, porém sem obter adaptações razoáveis nos termos da lei. Esse tratamento diferenciado, combinado com o pessimismo sobre a estagnação de carreira de uma PcD, minou a minha autoestima.

Foi também por volta desse momento que conhecidos me falaram de um tal de comunismo na Internet. Achei que seria algo tosco, mas fui aos poucos sendo convencida pela dialética materialista e a revolta foi me radicalizando. Me convenci que eu não teria chance de lutar sozinha e que precisaria me organizar. Me aproximei da FE, comecei a estudar e a participar das atividades.

Desde o começo esclareci a minha situação: eu estava adoecida pelo esgotamento e em recuperação. Minha coordenação compreendia que por causa disso eu não poderia participar de todas as atividades, mas isso não impediu que eu fosse estimulada a me envolver cada vez mais: mais participação em brigadas de venda de jornal, mais cotas individuais de jornal para vender, mais participação em atos e atividades de finanças, mais estudo e apresentação. Minha coordenação me disse que era o papel dela me estimular a fazer cada vez mais. Afinal, os comunistas praticam a profissionalização do trabalho de militância e nisso a FE era exemplar, mas havia um óbvio problema: Eu não estava em plenas condições de trabalhar.

Eu errei em ceder a esse estimulo. É parte do quadro clínico de esgotamento o histórico de alto envolvimento com o trabalho. E eu estava novamente cometendo o mesmo erro que me fez adoecer por causa de meu ofício. E minha coordenação não me ajudou a encontrar formas de aliviar o autojulgamento de “estar fazendo menos do que eu deveria”, muito pelo contrário, já que nos fazia ler materiais que explicitavam a importância moral do comprometimento e da disciplina. Ao invés de me parabenizar pelo que eu havia conseguido, eu recebia o estímulo a fazer ainda mais. Isto era contraprodutivo para meu momento de recuperação.

Afastamento

Em determinado momento eu desenvolvi hiperfoco em certa pauta compatível com o programa da FE. Observei que haviam organizações brigando por mudanças políticas com relação ao uso de dados e da tecnologia da informação. Como boa militante, passei a tentar convencer os companheiros de que precisaríamos debater essa pauta como organização também, assim como já era feito com a questão sindical, estudantil e feminina. Era, e ainda é, minha crença que a questão da tecnologia da informação necessita ser trabalhada de maneira organizada, sem aventureirismos.

Claramente eu estava propondo uma pauta que era maior do que a FE. As tentativas de trabalhar esse tema eram negligenciadas com argumentos fracos como “A FE é uma organização dentro da lei e não há motivos de tratar esse tema”. E por não verem o tema como relevante, o assunto foi silenciado: Comportamento típico de quadros antigos que insistem em interpretar novos fenômenos da forma que lhes é familiar. A pauta que estava em pleno debate público internacional foi menosprezada internamente. Não tive o espaço para desenvolvê-la e apresentá-la a mais pessoas além do meu núcleo imediato.

Aqui entra em ação a obstinação natural de uma pessoa autista. Quanto mais me ignoravam e me davam justificativas fracas, mais forte ficava meu interesse, mais eu me aprofundava no assunto, mais eu pesquisava, para poder convencer as pessoas de que esse assunto era (é!) importante. Eu fui fisgada pelo hiperfoco, e isso tem seu lado bom e seu lado ruim.

Eu pedi ajuda de minha coordenação para me ajudar a manter a calma, mas a ajuda que ela podia oferecer era insuficiente. Acabei agindo desesperadamente e quebrando a disciplina numa tentativa de chamar a atenção. A autocrítica é óbvia, pois eu já sabia que estava agindo de forma incorreta mesmo antes de me advertirem.

Contudo, continuo sem saber como poderia ter agido melhor. Sendo a pauta suprimida silenciosamente e estando desconfiada de omissão da minha coordenação, o que eu poderia fazer? A hierarquia não permitia que eu levasse a pauta para amplo debate, sob argumentos que não convenciam logicamente e sequer indicavam ter havido decisão coletiva anterior. Sem democracia não se pode exigir disciplina. Eu rejeito a acusação de individualismo e de desvio pequeno-burguês de minha parte. Se eu agi da forma como o fiz, foi por não ser capaz de tratar o assunto de outra forma. Há uma grave incoerência entre o que é dito (operamos na legalidade) e o que é praticado (decisões tomadas por organismos ocultos, sem envolvimento das bases). Que queriam que eu fizesse? Que me resignasse com o silêncio e aceitasse a minha insignificância em propor reivindicações?

Na ocasião da crítica realizada sobre minha conduta houve ainda um erro de agregar na mesma oportunidade a devolutiva sobre o teor da matéria que eu havia escrito. Julgaram meu texto idealista e anticientífico. Quem julgou, isso eu não tive o direito de saber. A devolutiva me foi passada anonimamente por minha coordenação. Seria eu idealista ou seria o avaliador secreto um passivo oportunista?

Me permitam demonstrar fraqueza por um instante. Essa devolutiva me destruiu um pouco mais. Eu estava há meses trabalhando nesse tema, de modo que ele tomou a importância de missão para mim, incentivada por minha coordenação que me exigia uma proposta mais estruturada para levar o tema para a apreciação do organismo superior. E depois de todo o tempo de pesquisa e estudo tudo que eu tive o direito de receber foram 2 rótulos negativos provindos de um avaliador anônimo. Isso me fez ter, em 2024, meu segundo colapso, sem haver ainda me recuperado do primeiro.

Os sentimentos de inutilidade e incapacidade retornaram, e eu chorei a maior parte dos dias naquela semana. Permito-lhes que me chamem de fraca ou de doente, ou até mesmo de imatura. O que rejeito, porém, é que me digam que eu estava errada. A mágoa era o sentimento possível naquele momento adoecido, mas hoje, entendendo que eu tinha a razão, posso transformar esse sentimento em raiva útil.

A conduta autodestrutiva que eu desenvolvi nesses 4 meses de depressão profunda, felizmente está ficando para trás.

Reorganize-se da forma que der

Mesmo acreditando que eu estava correta eu não tenho força ainda para voltar naquele ambiente e lutar para que o certo seja aplicado. Por meu movimento de autopreservação fui chamada de sectarista. Isso consolida a crença de que eu não sou bem-vinda naquele espaço. Não há acolhimento de minha condição de saúde, nem tampouco de minha neurodivergência. Podem me chamar de idealista, mas eu continuarei defendendo que ninguém é obrigado a estar em um espaço em que se é excluído. Se o preço para isso é não poder atuar na construção da revolução brasileira, então esse é um custo que eu terei que arcar. A gente faz o que dá, e pra mim não dá pra seguir recuperando minha saúde e minha capacidade de trabalhar naquele coletivo.

Acredito hoje no que disseram algumes amigues: que a organização necessita merecer a nossa participação tanto quanto nós necessitamos merecer estar na organização. Eu sou uma pessoa neurodivergente, com necessidade de suporte aumentada por conta do adoecimento que o trabalho me proporcionou e do qual tenho ainda sequelas. Se uma organização de massas tal qual a FE não é capaz de me acolher, ela então não me representa. Arrisco que não representa nenhuma pessoa com deficiência ou que se encontre incapacitada para o trabalho de forma temporária ou definitiva.

Felizmente eu fui acolhida em outra organização, de ideologia anarquista. Não que eu tenha passado a rejeitar o marxismo e os aportes de validez universal de Lênin sobre como realizar a revolução. Acontece que neste momento eu necessito mais do que contribuir para a construção do socialismo científico. Preciso voltar a me julgar útil e competente. O coletivo anarquista me oferece uma forma de me integrar no trabalho coletivo dentro das minhas possibilidades, e isso favorece a minha cura.

O anarquismo é o meio-termo que permite que eu siga trabalhando coletivamente, de forma não alienada, no presente. E vendo a enorme quantidade de pessoas neurodivergentes que estão em coletivos anarquistas, vejo que não sou só eu que, apesar de rejeitar a ideologia individualista, não se adequa para estar em um coletivo marxista-leninista. Os comunistas estão falhando conosco, e não poderemos trabalhar juntos enquanto o capacitismo não for adequadamente tratado.

Lembro que autistas verbais (comumente chamado de nível “leve”) tem 9 vezes mais chance de cometer suicídio do que pessoas neurotípicas. Prosseguir moralizando inadequações de neurodivergentes é fazer pouco caso dos problemas comportamentais e de convivência que caracterizam o quadro de TEA, bem como outras condições. Demandar a inclusão hoje é garantir que o movimento trabalhador cresça com o apoio das potencialidades de neurodivergentes, para que não tenha que, vitoriosa a revolução, condenar-nos dissidentes que devem ser exterminados.

 
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Contextos

Essa é uma das melhores receitas que faço. Mal me lembro onde eu a encontrei pela primeira vez. Acho que numa versão antiga do Receitas de Minuto. Fiz umas pequenas adaptações, alterando a proporção de farinha de trigo e leite; e guardei a receita já adaptada em anotações próprias.

Porém, fazia algum tempo que não colocava esse bolo para assar. Por ser um bolo pão de mel, o ingrediente essencial e chave para ficar uma delícia é: mel.

E qualquer um que frequente um supermercado ou lojinhas à granel sabe o preço proibitivo de uma garrafa de mel.

Eu perdi meus atravessadores pessoais desse líquido viscoso e dourado: os pais de um amigo moravam no interior (Tianguá), e iam e vinham com frequência para a capital, agora se mudaram de vez e já não podem fazer o tráfico.

Até o dia que, após comentar com uma colega de trabalho sobre esse bolo, ela ficou de me trazer mel. Demorou, mas ela chegou com um pote daqueles de geléia cheinho de mel bem claro. Como gratidão, fiquei de levar o bolo para os colegas e, num domingo à tarde, tomei coragem de prepará-lo (não que seja difícil o preparo, mas às vezes só queremos ficar de barriga pra cima nos domingos à tarde).

Receita

Ingredientes

Bolo

  • 1 colher (sopa) de bicarbonato de sódio em pó
  • 3 xícaras (chá) de leite
  • 3 colheres (sopa) de manteiga
  • 3 xícaras (chá) de açúcar
  • 1 xícara (chá) de mel
  • 5 xícaras (chá) de farinha de trigo
  • 1 colher (sopa) de canela em pó

Ganache

  • 100gr de chocolate meio amargo derretido
  • Creme de leite

Modo de Preparo

  1. Untar a forma e pré-aquecer o forno a 200~230°C.
  2. Dissolva o bicarbonato em uma xícara de leite.
  3. Coloque na batedeira junto com todos os outros ingredientes. Sem uma ordem específica. Botar os secos primeiros talvez ajude a não voar farinha por aí.
  4. Bater até ficar homogêneo.
  5. Levar ao forno por cerca de 30 a 40 minutos. Fazer o teste do palito para ter certeza.
  6. Deixe o bolo esfriar para desenformar.
  7. Para ganache, derreta o chocolate em banho maria ou pondo de 30 em 30 segundos no microondas. Adicione creme de leite ao chocolate derretido. Isso sempre faço no olho, perdoe. Evite por muito creme de leite para não ficar sem gosto. Depois basta espalhar sobre o bolo.

Fotos dessa belezura

Foto da massa homogênea dentro da batedeira. O gancho da batedeira está levantado e os pingos da massa mostram que fica mais líquida mesmo

Observem a consistência da massa, é mais líquida mesmo.

Foto de dois bolos pão de mel ainda na forma sobre um tampo de madeira. A cor deles é morena clara.

Fui obrigado a fazer dois bolos: um pro trabalho e um para casa, pois minha esposa não admitiu dividir. Essa foto foi batida logo após eles sairem do forno. Observem que o bolo fica moreninho mesmo, mas ainda claro.

Foto de dois bolos pão de mel ainda na forma. Eles estão mais escuros do que no momento que saíram do forno.

Essa foto foi batida no dia seguinte, antes de desenformar. Vejam que eles ficam mais morenos. Lembrem disso pra evitar queimar.

Foto do bolo partido, a massa interior tem cor marrom clara, parece bastante aerada. O bolo está coberto com ganache de chocolate.

Me diga se essa foto não entregou tudo?

Perguntas perguntadas com frequência

Qual o tamanho da forma para essas quantidades? Uma forma grande de bolo furado no meio, normalmente com 24cm de diâmetro. Normalmente eu faço metade dessa receita para uma forma de 20cm de diâmetro.

Pode trocar a manteiga por margarina? Pode, não tem grandes alterações de sabor ou textura…

Ao desenformar, mesmo untando bem, uma parte ficou grudada na forma. O que fazer? Fica mesmo, desconfio que é fruto da alteração de proporções de leite e farinha que fiz. A massa fica menos densa quando crua, em compensação fica bem molhadinha quando pronto. Aceitei que há males que vem para o bem! Também é uma ótima desculpa para cobrir o bolo de ganache.

Pode fazer a ganache com chocolate ao leite? Aposto 10 real contigo que com chocolate meio amargo o equilíbrio do bolo e da cobertura vai ser melhor, mas seja livre.

Precisa mesmo cobrir com ganache? Não, ninguém é obrigado a ser feliz!

Pode trocar mel de abelha por mel karo? Não! Saia imediatamente daqui!

 
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Tags: #Militância

Nota da autora, 19 de setembro de 2024: Este texto foi escrito em 12 de maio de 2024 e enviado para a redação paulista de um certo jornal comunista. O texto até então não foi publicado e a justificativa oficial foi que a redação estava sobrecarregada para revisá-lo e publicá-lo. Hoje, após 4 meses de espera, acho que posso afirmar que a falta de retorno sobre o texto reflete uma omissão incorreta da redação do jornal. Confiante de estar defendendo a linha correta, e tendo as possibilidades de debate interno no partido sido negadas, torno público este texto para que seja conhecido e criticado abertamente.

Nota da autora, 24 de setembro de 2024: Faço a autocrítica e considero incorreta minha atitude de expor o nome da organização e do jornal. O objetivo deste compartilhamento é tornar a matéria pública para debate e não em criticar o trabalho desta ou daquela organização.

O compartilhamento deste texto é permitido segundo a licença CC BY-ND 4.0.


Nos dias 10 e 11 de maio de 2024 ocorreu em São Paulo mais uma edição da Cryptorave, o maior evento aberto e gratuito de criptografia e segurança do mundo, que reuniu, em 24 horas, diversas atividades sobre segurança, hacking, privacidade e liberdade na rede. Inspirada em uma ação global para disseminar e democratizar o conhecimento e conceitos básicos de criptografia e software livre, o evento teve início em 2014, como reação à divulgação de informações que confirmaram a ação de governos e corporações para manter a população mundial sob vigilância e monitoramento constantes.

O público presente revelou à quem mais interessa debater segurança digital e tecnopolítica. Mulheres, pessoas negras, neurodivergentes e trans marcaram forte presença tanto na plateia quanto no palco, contrariando o estereótipo de um setor dominado por homens cis héteros e brancos. Um lembrete de quais são os grupos dentro da classe trabalhadora que mais sofrem opressão e violência, inclusive nos espaços digitais.

O keynote de abertura, sob o tema “Tecnologias de IA e seu impacto nas vidas e narrativas Palestinas” reforçou o posicionamento político do evento, denunciando mais uma vez como as tecnologias digitais tem sido usadas para explorar e violentar a população.

Mesmo onde não há uma guerra declarada, governos ainda perseguem sua própria população tratando-a como um inimigo interno. O Movimento Passe Livre (MPL) propôs uma roda de conversa sobre segurança e autodefesa trazendo informações sobre como movimentos sociais estão sendo criminalizados, e que isso é um projeto de São Paulo, do Brasil e de toda a América Latina.

Relatos de vazamentos de informações internas dos movimentos e coação de menores de idade para fazer a identificação de pessoas em fotos publicadas em mídias sociais confirmaram que a preocupação com segurança não se trata de paranoia. Trata-se de uma postura urgente para garantir os direitos constitucionais à livre manifestação de pensamento, a plena liberdade de associação para fins lícitos, a inviolabilidade da intimidade e da vida privada, a inviolabilidade das comunicações – salvo com permissão judicial – e o direito à proteção dos dados pessoais, inclusive nos meios digitais.

No keynote de encerramento “Tecnoautoritarismo: Spyware, OSINT e outras tecnologias de vigilância na América Latina” foram denunciadas as táticas de censura e espionagem dos governos contra nossos companheiros no Equador, Colômbia e México. Fica evidente, a partir de contratos de governos na América Latina para uso de ferramentas de espionagem israelense, que o avanço da máquina de guerra sobre a Palestina não é apenas uma ameaça imediata para o povo palestino, mas também uma ameaça para nós na América Latina, ao passo que o desenvolvimento de software para a guerra israelense são financiados com dinheiro público de governos latino-americanos e usados, sem a devida previsão legal, contra o próprio povo.

As novas tecnologias informacionais são a tônica de nosso velho e admirável mundo novo. Um mundo onde tudo muda a velocidades crescentes, mas apenas para intensificar e diversificar as velhas formas de produção e extração de mais-valia. É preciso rever o colonialismo não como um fenômeno do passado, mas como um processo que perdura e se atualiza com novas expressões, e que hoje se apresenta em formato digital. A questão da tecnologia não é uma questão isolada, mas parte da materialidade do nosso tempo, se inserindo nas relações sociais como um elemento constitutivo da sociedade.

Não é mais tolerável que militantes ignorem o debate sobre segurança da informação. Dados e metadados estão sendo coletados em enorme escala e armazenados indefinidamente em grandes centros de processamento de dados. Essas informações são agregadas com uso de técnicas de inteligência artificial (IA) para reduzir o trabalho vivo necessário, permitindo aumentar a quantidade de informações processadas por governos e corporações em uma escala sem precedentes. Técnicas estas que avançam ano após ano, e que poderão ser aplicadas retroativamente em dados coletados no presente para o perfilamento de militantes e ações contrarrevolucionárias.

O esforço e o custo necessários para adotar e manter soluções alternativas, independentes de plataformas controladas pelos monopólios de tecnologia, devem ser priorizados para a segurança de nossos militantes e a continuidade de nossa luta, ao passo que atrapalham a coleta de informações e, por consequência, as práticas de espionagem adotadas pelos governos contra a sua própria população.

É preciso lutar pelo fim da exploração, mas também pelo fim da expropriação de dados. O atual estágio de desenvolvimento tecnológico abriu novos caminhos para a exploração do trabalho, mas também as formas de lutar e se organizar. O caminho contudo permanece familiar: tomada de consciência e muita organização popular!

 
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Quem me segue lá pelo @yuribravos@bolha.one viu que tomei dois dias para testar o Sharkey na capivarinha.club.

Pensei algumas várias vezes antes de fazer isso, já que o Mastodon já é um microblog e eu definitivamente não preciso de dois. Acontece que tenho uma sanha por testar coisa nova.

Experimentações & repetório

Jogo RPG desde os 17 anos. Comecei com um sistema, que joguei durante muitos anos. Aí conheci outro. Depois mais um. Depois mais outro. E hoje conheço e joguei algumas dezenas de sistemas de RPG. Me divirto muito de conhecer novas mecânicas e de vê-las em jogo, mesmo que seja só uma vez. Acho que foi jogando vários RPGs que eu entendi a importância de ter repertório.

Inclusive se você quiser ver algumas sugestões de jogos de RPG dadas por mim, fiz metade da hashtag #rpgaday2024. A vida me deu rasteiras na metade, mas fica essa contribuição.
Ceci n'est pas une citation

Sim, e o que tem a ver?

Tem a ver que essa minha incapacidade de ficar sem testar um negocinho novo me mordeu outra vez e decidi pular dentro da capivarinha para descobrir um fork do Misskey. Cabe dizer que o Arlon, companheiro aqui de blog.ayom.media no Ideias de Chirico já havia alardeado aos quatro ventos como o Mastodon era limitado e não tinha várias coisas legais que outras plataformas como o Akkoma e o Misskey tinham.

Ele e o Kariboka — que mantém a harpia.red e esse ótimo post com links para várias instâncias br do fediverso — vez ou outra mostram como o Akkoma é legal.

Acontece que a estética mais crua das instâncias de Akkoma que vi não me atraía muito. E sim, para mim, ser bonito é essencial. Não à toa uso o Phanpy como cliente web do Mastodon.

Até que apareceu uma instância brasileira no Sharkey. E olha só a cara dessa desgraçada:

Não me contive e decidi testar!

Maximalismo?

A primeira impressão é que o Sharkey é um mundo. Tem muitas timelines, mais que o Mastodon. Você pode reagir com qualquer emoji que a instância tiver personalizado. Tem um sistema de desbloqueio de conquistas. A página web tem widgets na lateral que são personalizáveis. Tem umas paradas como antenas e canais que eu ainda estou tentando entender melhor como funcionam (e que constinuem timelines também). E as más línguas ainda dizem que tem joguinhos dentro da parada (esses não achei e é provável que não os procure).

Então, ao primeiro momento, fiquei confuso. Passei um dia apenas olhando todas as abas, todas as configurações possíveis (e são muitas). E decidi levar adiante o teste.

Nomadismo digital

Aqui foi que me dei conta que o fediverso permite um nomadismo digital diferente do home office pelo mundo a fora: é possível trocar de redes sociais. Sem o sofrimento de começar do zero.

Baixei a lista de pessoas que seguia no Mastodon e importei o arquivo no Sharkey. Alguns momentos depois, já seguia mais de cem pessoas. Minha timeline no Sharkey estava tão povoada quanto a do Mastodon. Foi quando entendi que o verdadeiro valor da rede social são as pessoas que você segue. Pude, então, fazer um teste perfeitamente equiparado entre as plataformas, já que não estava tolhido por não ter conteúdo para ver.

Isso foi incrível.

Personalização

Algo que gosto muito é poder personalizar as coisas. Adoro isso no RPG. Adoro isso em qualquer coisa que use. O Sharkey parece ter sido feito por pessoas que adoram isso também.

Mexer nas configurações dele é um mundo sem fim. Tem muita coisa que você pode habilitar e desabilitar. Inclusive configurar sua reação padrão, já que não existe uma única reação possível. Deixei minha reação padrão uma estrela, como é originalmente o favorito no Mastodon.

Isso se estende também para o aplicativo Aria. Dá para personalizar a cor de fundo de alguns tipos de nota. Aproveitei isso para chupinhar o Phanpy e pintar de laranja as DMs. O aplicativo inclusive permite ajustar quais botões aparecem para interagir com as notas. Botei o botão de tradução, para facilitar minha vida, e o de reação automática, já que boa parte das pessoas que sigo são do Mastodon (e ao que me consta, parece que eles só recebem favoritos se usar a reação padrão).

É possível, inclusive, ajustar o tamanho desses botões. Aumentei o tamanho dos meus pois, muitas vezes, estava abrindo a nota invés de interagir com ela.

Poder fazer tudo isso é incrível!

E acho que esse é o grande ponto forte do Sharkey: poder fazer muita coisa, inclusive não usar todas as coisas que ele oferece. Lá tem suporte nativo para markdown e, embora eu ame botar um negritozinho aqui outro ali, devo usar só em 10% das postagens que faço. Ainda assim, é melhor poder fazer do que não poder fazer.

Mastodon ou Sharkey?

E agora que descobrimos que o Mastodon não é a plataforma mais legal de microblogging do fediverso? É ótimo haver opções. Poder levar as pessoas que você segue de um lugar para outro é o que garante que você pode, de fato mudar de instância a qualquer momento.

Não fiz ainda nenhuma migração. Talvez nem faça, pois aparentemente não precisarei. Da mesma forma que apenas desativei minha conta no Pixelfed, talvez deixe uma conta congelada num dos dois lugares.

Se você está no fediverso, mas somente no Mastodon, talvez valha a pena conhecer outras plataformas. Pra mim valeu demais!

 
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from vereda

Tags: #Militância

Não basta organizar a classe trabalhadora, é preciso educá-la para gerir a produção de maneira científica.

De pouco adianta desenvolver hábitos e competências em cima de ferramentas e serviços que fortalecem a subordinação ao imperialismo. Patentes, marcas, direito autoral e todo o conjunto de leis de “propriedade intelectual”¹ são usados para nos aprisionar enquanto usuários de “soluções”² sob forte controle do grande capital internacional.

Obviamente rejeitamos a ideia de usar a língua estrangeira como principal ferramenta de comunicação dentro de nossas organizações e conhecemos a importância de uma moeda própria para a soberania nacional. Deveria ser óbvio então que precisamos resistir a usar ferramentas de processamento da informação que não possam ser rapidamente substituídas por alternativas sob controle popular.

O uso de produtos de software privativo (Windows, MS Office, Google Drive, AWS EC2, Zoom, etc) em detrimento de produtos de software livres (Linux-libre, Libreoffice, Nextcloud, KVM/QEMU, Jitsi, etc) precisa ser encarado como subordinação à superpotências estrangeiras e negação da nossa soberania. Mais do que o simples consumo de bens manufaturados no exterior, em detrimento da produção nacional: Esses produtos possuem características exclusivas que os tornam impossíveis de serem replicados, nos colocando em uma relação colonialista cada vez mais grave a medida que permitimos que eles tornem-se monopólios de nossos hábitos computacionais.

O nosso esforço organizativo precisa substituir os processos artesanais e manuais por alternativas cada vez mais informatizadas, mas sempre usando ferramentas que jamais nos aprisionem em um colonialismo digital tais como os softwares privativos.

Desconfie de qualquer revolucionário que adote uma postura rebaixada e se recuse a reconhecer a importância dos meios computacionais para a sociedade do século XXI, resignadamente aceitando usar, bem como promover, softwares não livres.

Esses são alguns coletivos e organizações com caráter de classe que estão hoje pavimentando o caminho para o controle popular:

¹ Por que a propriedade intelectual é um termo enganoso ² O que nos é ofertado como solução para nossos problemas é na verdade solução para os problemas do imperialismo em como nos vigiar e controlar

 
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from yuribravos

Meu toot fixado no mastodon é:

Me chamo Yuri Bravos. Aqui costumo falar de coisas que estou pensando (no gerúndio mesmo), muitas vezes sem conclusões apresentadas.

Costumo pensar em temas como urbanismo, sustentabilidade, aprendizado de línguas, rpg de mesa, espiritualidade católica, filosofia, animes, ser no mundo, etc.

E meio que é o que eu pretendo fazer aqui, mas de modo mais estendido. Pensei em começar aqui com espiritualidade católica, mas os receios me impediram e em outro post posso vir a falar sobre isso.

Então hoje será sobre coisas que estou usando a algum tempo e sobre como estou avaliando esse uso. A curadoria de experiências não seguirá nenhum critério lógico além de: estou usando e estou pensando no uso.

Então, vamos!


Tênis barefoot

Primeiro, urge um termo em português pra esses sapatos com desenho mais largo, coerentes com o formato natural de um pé humano. 🦶

Comprei um modelo descontinuado da Feet of Tomorrow cujo nome era Yette. Estava em promoção num preço pagável, embora não barato (menos de 350 reais).

Foto publicitária do modelo de tênis Yette da Feet of Tomorrow. Mostra um pé do tênis de lado. O tênis é branco com detalhes frontais e laterais cinza, o cadarço é preto. O aspecto do tecido do tênis é de um tecido bastante respirável pois tem inúmeros pequenos furos.

Eu trabalhei muito tempo como autônomo, então tinha muita liberdade de usar sandálias ou chinelas. Quando passei a trabalhar num emprego CLT tradicional, precisei usar sapatos. E terminava o dia com o pé incomodado, sabe? Não era dor, mas passava o dia apertado e era desagradável. Decidi apostar.

Estou usando ele há cerca de dois meses, quase todos os dias. Demorou um pouco mais que o esperado porque segui a medida de tamanho do site, que dizia que eu deveria usar um 39, e acabou que o sapato ficou pequeno. Tive de fazer a troca para o número padrão que sempre usei que é 40.

O modelo é bem ajustado ao tornozelo pois ele tem um elástico com desenho bem compatível ao volume dessa articulação. O espaço para o pé é bem maior mesmo e os dedos não ficam absolutamente em nada apertados.

Sendo que o modelo tem umas partes mais rígidas nas laterais: a parte cinza que dá para ver nas fotos. Como estou usando sem meias, já que elas também comprimem o pé, quase fico com um calo no pé esquerdo por conta disso. Algumas semanas de uso e já não é um problema.

O sapato é bastante flexível e tem um solado fino, o que permite sentir seu pé atuando como um pé enquanto você caminha: os dedos se mexem, fazem força e se flexionam, de maneira muito similar a se estivesse descalço.

O uso durante oito horas ainda gera algum leve desconforto. Contudo, com sapatos normais eu precisava massagear o pé para aliviar, com este, dez minutinhos depois de tirar já está tudo certo.

O cadarço deixa um pouco a desejar, é fininho e desamarra com bastante facilidade.

Objetivo da aquisição foi atingido ✅: próximos tênis devo comprar no mesmo estilo e provável na mesma marca.


Pulseira Inteligente

Foi um misto de curiosidade de oportunidade. Sabia que essas pulseiras servem mais como sensores de sinais vitais. Não era muito minha praia, mas estava curioso e tive a oportunidade de comprar por 150 reais. Comprei a Mi Band 8 da Xiaomi.

Foto publicitária da Mi Band 8. A tela da pulseira tem um formato retangular, mas as pontas terminam em semicírculos. A pulseira em si é de borracha preta fosca. A tela pode ser trocada, a da foto mostra a tela padrão de fábrica com horário, data, temperatura e porcentagem de bateria e contadores no formato de pista de atletismo em três cores.

Por algum tempo usei todas as funções de medição ativa e depois de alguns meses as métricas estavam bastante consistentes. Pude atestar que dormia bem, meu nível de estresse é surpreendetemente baixo — o dia de maior transtorno pontou 46, normalmente fica 36 — e meu coração bate os esperados 80 bpm.

Desativei quase todas as medições e agora me divirto mudando as telas da pulseira de acordo com a roupa que estou usando, respeitando minha paleta pessoal. Queria comprar as pulseiras alternativas, porém nunca achei para vender que chegasse no Brasil.

As notificações na pulseira, meio que cortei quase todas. Tem hora que você surta, mas é ótima para o alarme de bater o ponto.

Objetivo da aquisição foi... atingido? ✅: não tinha muito objetivo, pra falar a verdade. Era um teste. Não sei se compraria outra igual. Talvez um relógio inteligente sim, mas uma pulseira, não. Dito isso, usarei essa até se acabar.


Zen to Done

Pra não falar só de objetos adquiridos, vamos falar de hábitos. Conheci esse método de organização pessoal pelo site do @augustocc@social.br-linux.org o Efetividade.

Li, achei interessante, vi alguns outros posts relacionados e comecei a tentar fazer. As primeiras tentativas foram meio xoxas e capengas, mas o conceito das Grandes Rochas é bem bacana e lhe ajuda a resolver as coisas que você achou importante pro dia.

Depois eu localizei um pdf traduzido descrevendo melhor o método e que está disponível aqui e captei mais alguns detalhes importantes. Foi aí a coisa começou a andar melhor.

Ainda estou adquirindo o hábito de capturar tudo e de começar o dia fazendo as Grandes Rochas, mas algumas coisas já começaram a andar. Por exemplo, eu finalmente comprei uma pedra de amolar (a famosa mó) para manter as facas da cozinha lá de casa em condições de uso. E vi vídeos sobre amolação de facas e fiz a primeira tentativa. Eu tava querendo fazer isso tem meses.

Então se deu efeito nisso, imagina nas coisas importantes de verdade.

Ainda planejo ler o livro completo.

O processo de aquisição de hábitos vai bem, obrigado.


Big Linux

Com o tempo a gente fica velho e sem paciência pras coisas. Inclusive para ficar crackeando programas e sistemas. O Windows do meu computador além de me humilhar dizendo que não estava ativo, ainda me impedia de trocar meu papel de parede.

Então eu tive que tomar medidas drásticas.

Tela de boot do Big Linux. No centro o logo da distribuição é circundado de um círculo azul formado por 3 arcos de círculo que giram dando uma sensação de carregamento. O logo é a palavra big escrita em azul. O fundo da tela de boot é preto.

Larguei o Windows queimando pontes com quaisquer programas que usava enquanto atuava como arquiteto e pulei para um Linux. O plano era manter um dual boot para ter a segurança de um sistema que conhecia e testar o novo. Mas o grub nunca apareceu, não importasse o número de feitiçarias que me ensinassem no fediverso ou que eu procurasse nos fóruns de dúvidas. Então decidi deixar só o Big Linux.

Escolhi essa distribuição porque é brasileira e sou meio bairrista, sim. E em algum lugar do site também dizia que o Big Linux era a melhor coisa desde o pão com manteiga. Isso me pegou demais!

Estou fazendo um uso bem de usuário médio, tendo que me adaptar com alguns programas com interface nova, mas nada que seja do outro mundo. Algumas coisas não funcionaram de primeira, como usar o celular de câmera no Discord. Mas segui a dica de instalar o programa via Flatpack e funcionou. Estava usando antes um webapp já configurado da distro.

No geral, segue tudo muito bem e tudo muito bom. Tô aprendendo várias coisas. Acho que não volto pro Windows, a não ser obrigado.


Vamos parar por aqui para não ficar muito longo. O objetivo desse post era simplesmente começar. Pois começamos.

 
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from Resenha Cibernética

A ficção valor

Em Marx aprendemos que no Capitalismo impera a lei do valor.

O valor significa que há uma equivalência geral de tudo com tudo. Mas o valor não é o valor de troca, no qual a troca “zeraria” o valor (valor de soma zero), mas sim o valor de “acumulação”, de soma não nula.

Isso significa que o valor não é uma equivalência geral, mas que se sustenta sobre uma “inequivalência”. Esta não equivalência corresponde, segundo Marx, ao trabalho não pago do trabalhador. Assim, o trabalhador recebe um salário pela sua “força de trabalho”, que é um valor de troca, mas seu trabalho não pago é um excedente além da troca, que fica com o empregador.

Marx diz que o capitalismo só ocorre porque há um “trabalhador livre”, que aceita não só vender (alienar) sua força de trabalho por um salário, mas trabalhar um pouco mais sem ser remunerado. Este valor não pago é o valor propriamente dito, i.e., o mais-valor, porque sempre acumula. Acumula precisamente sob a forma de capital.

Mas Marx também diz, n'O Capital, que antes da acumulação do trabalho não pago, houve uma acumulação primitiva que gerou o “capital inicial”, que correspondeu aos “cercamentos” (enclosures) das terras. Com isso, aquilo que era abundante, as terras comunais (the commons), tornou-se raro. Ora, o capital só viceja onde há raridade.

Os cercamentos liberaram os trabalhares da terra para serem “livres” na cidade. Livres para serem explorados e trabalharem o trabalho não pago.

Outro grande pensador chamado Karl, o Polanyi, disse que havia três mercadorias “fictícias”: a terra, o trabalho e o dinheiro. Fictícias porque são mercadorias que não podem ser trocadas, a não ser por meio de ficções chamadas falácias.

Assim, é lícito pensar, baseado nos dois Karls, que o capital é gerado ficcionalmete nesta ordem: primeiro, ocorreram os cerceamentos; esses criaram os trabalhadores livres e o trabalho não pago; e o trabalho não pago gerou o capital financeiro, que pode ser vendido como se fosse uma mercadoria.

Podemos assim citar três modos de produção do capital e não apenas um como queria Marx: a expropriação da terra (da natureza) pelos cerceamentos, a exploração dos trabalhadores pelo trabalho não pago (nos cercados fabris da produção) e a especulação do dinheiro, nos cercadinhos financeiros das “bolsas” e “bancos”.

O que é fictício no capital é precisamente esse ato de cercar, de impor um limite onde antes não havia. Mas essas cercas são antes de tudo simbólicas, pois o que garante a propriedade de um bem comum a não ser um acordo simbólico imposto ou não pela força bruta?

Alguém, em algum momento, disse: “isto aqui é meu”. E deste ato de fala nasceu a ficção do valor. E daí a expropriação, a exploração e a especulação foram apenas a consequência denominada de Capital, o “valor que se autovaloriza”.

 
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from Resenha Cibernética

O próprio e o impróprio

Seguindo os passos de Engels em A Origem da Família, eu diria que a luta de classes mais primordial é entre proprietários (que definem o que é próprio) x desapropriados (que são impróprios). Desapropriados daquilo que é comum a todos. Próprio/Impróprio é a distinção fundamental de todo meio (medium). Engels escreveu que esta distinção marca o início do patriarcado. O matriarcado seria então uma sociedade em que tudo é próprio, tudo é comum.

 
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from vereda

Tags: #Pessoal

Stay On The Path. Photo by Mark Duffel on Unsplash

“Tô pensando em chegar aí na quinta e sair daí no domingo. O que você acha? Me avisa se for muito tempo pra você”

Era véspera de um feriado prolongado e uma amiga estava planejando passar alguns dias na minha casa, em São Paulo. Eu havia acabado de dedicar um esforço descomunal pra lançar o novo site da DandaraLab com um prazo apertado e estava com demandas atrasadas, inclusive a negociação de duas novas parcerias da DiversifiX. A única coisa que eu conseguia pensar sobre o feriado é que seria a minha chance de me adiantar com os projetos que estavam sob minha responsabilidade.

“Tá tranquilo. Vai ser fantástico. Você é a única que ainda não veio me ver em sp!”

Eu não tinha tempo a perder e mesmo assim parei por 4 dias para dedicar tempo e atenção a ela. Foi um feriado maravilhoso que nos deixou ótimas memórias. Essa poderia ter sido uma decisão demorada e fonte de medo de fazer a escolha errada, mas felizmente eu relembrei um dos meus princípios e nele fundamentei a minha decisão:

Eu estabeleço e cuido de relacionamentos pessoais como uma das minhas maiores prioridades. Eu sempre tenho tempo para família ou para um amigo de verdade. Minha lista de tarefas e calendário refletem o quanto eu valorizo as pessoas na minha vida.

O que são princípios?

Princípios são normas de conduta, geralmente impostas por terceiros, para cumprir exigências morais ou legais. Devido ao caráter forçado, muita gente tem memórias ruins ao falar de princípios, mas existe um grande valor em reconhecer e utilizar uma lista pessoal de princípios.

Estando consciente disso ou não, todas as pessoas possuem certos valores e seguem determinados princípios derivados deles. Todos possuem uma bússola interna dizendo não apenas aquilo que é certo ou errado, mas também indicando aquilo que vai gerar mais satisfação de vida.

Inspirada no post General Operational Principles do Taylor Pearson e no livro Work the System do Sam Carpenter eu resolvi também dedicar tempo para identificar e documentar o que eu acredito e valorizo.

Os Princípios Gerais de Operação são basicamente uma síntese daquilo que a nossa bússola moral tenta nos dizer, registrados de forma explícita para facilitar a tomada de decisões.

Sempre que não houver uma forma clara de resolver alguma coisa, sempre que uma decisão precisar ser tomada, os Princípios Gerais de Operação são uma sólida referência guiando minhas ações para me gerar maior satisfação e menos arrependimentos.

“Estes são meus princípios. Se você não gosta deles, tenho outros!” – GROUCHO MARX

O documento de princípios precisa ser rígido, porém mutável. Para que os princípios sirvam como guia de conduta, eles precisam ser estáveis independente das circunstâncias. Porém também devem ser algo vivo, que se adapta para acompanhar as mudanças de nossa bússola moral ao longo do tempo. Alguns valores permanecem conosco por toda a vida, mas outros tem sua importância modificada conforme atravessamos diferentes fases da vida.

Eu produzi meu primeiro documento de Princípios Gerais de Operação em Outubro de 2018. Ocasionalmente eu dedico um tempo para rele-lo, mantendo todos eles frescos na cabeça, e para revisar cada um dos itens que eu mantenho nesta lista. Alguns princípios surgiram depois, conforme eu percebi que certas coisas importantes para mim não estavam ainda contempladas. Outros princípios foram reescritos para passar uma mensagem que fosse mais verdadeira para mim. A essência do documento porém continua a mesma e eu acho que, conforme o tempo passa, tenho cada vez mais clareza daquilo que eu valorizo e de como deve ser minha atitude para aproveitar cada vez mais a vida.

Sem mais demoras, apresento a minha lista na forma como ela está em Julho de 2024:

(meus) Princípios Gerais de Operação

Como eu recebo aquilo que o mundo me traz

  • Coragem: Eu não fujo de confrontos ou de oportunidades por causa do medo. Eu atuo fora da minha zona de conforto.
  • Aprendizado: Eu acredito que todo evento pode contribuir para o meu crescimento. É meu dever encontrar o valor e o aprendizado mesmo nas situações ruins.
  • Firmeza: Flexibilidade tem medida certa. A rigidez é a nossa estrutura permanente para enfrentar o inesperado.

Como eu invisto minha energia

  • Atenção: Eu direciono meu foco para aquilo que é mais importante para mim em cada momento. Eu não permito que outros tópicos roubem minha atenção.
  • Equilíbrio: Eu valorizo viver de forma plena e integrada e por isso eu busco obter satisfação em todas as áreas que são valiosas pra mim.
  • Intenção: Eu conscientemente aloco a minha energia de forma construtiva para que ela não assuma espontaneamente formas destrutivas.
  • Qualidade: Todas as coisas grandes e valiosas exigem esforço e comprometimento. Em todas elas eu estou disposta a me esforçar, fazer mais do que é esperado e persistir. Inspiração: [The Dip]

Como eu lido comigo e com outras pessoas

  • Autenticidade: Eu acredito que vulnerabilidade e sinceridade são os caminhos para conexões genuínas e bons relacionamentos.
  • Intuição: Eu invisto em minha auto percepção. Eu presto atenção e respeito aquilo que meu corpo e meus instintos tentam me dizer.
  • Desenvolvimento: Eu fortaleço contradições e o debate para promover o amadurecimento meu e alheio.
  • Diversidade: Eu valorizo e respeito a diversidade. Eu apresento minha forma de ser e pensar como um único exemplo dentre as múltiplas possibilidades e não como a única opção possível. Inspiração: [Pedagogia do oprimido]
  • Comunidade: Eu estabeleço e cuido de relacionamentos pessoais como uma das minhas maiores prioridades. Eu sempre tenho tempo para família ou para um amigo de verdade. Minha lista de tarefas e calendário refletem o quanto eu valorizo as pessoas na minha vida.

Como eu atuo no mundo

  • Legado: Quando tomo decisões, considero os efeitos de ordens superiores e não somente os efeitos mais diretos; eu sigo a perspectiva do sistema no longo prazo.
  • Propósito: Tudo que eu faço serve a uma visão maior que eu tenho para mim e para o mundo. Eu fabrico a realidade que eu quero que exista.
  • Colaboração: Eu acredito que obtemos melhores resultados quando existe colaboração profunda e solidária entre pessoas. Inspiração: [Linus Torvalds]
  • Repetição: Eu sou o que faço repetidamente. Cada ação não é um evento isolado, mas um reforço para os neurônios que moldam meu comportamento e personalidade. Inspiração: [The Bowling Game Kata]
  • Condicionamento: Eu me lanço consistentemente em desafios para me manter sempre apta para aproveitar oportunidades e superar contratempos. Inspiração: [Antifragile]
  • Sustentabilidade: Eu reconheço a importância de estar descansada para tomar boas decisões e produzir trabalho de qualidade. Se eu estou cansada, eu trato de descansar para atacar novamente o problema quando estiver recuperada.

Hierarquia de Valores

Esta seção é um experimento, inspirado pela Teoria da Desintegração Positiva de Dąbrowski. Dediquei um tempo para ponderar qual a hierarquia que os princípios mencionados tem para mim. O resultado atual segue abaixo:

  1. Autenticidade
  2. Coragem
  3. Atenção
  4. Intuição
  5. Desenvolvimento
  6. Aprendizado
  7. Legado
  8. Propósito
  9. Equilíbrio
  10. Firmeza
  11. Intenção
  12. Qualidade
  13. Colaboração
  14. Diversidade
  15. Repetição
  16. Comunidade
  17. Condicionamento
  18. Sustentabilidade
 
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