Notas de voz sobre “Her” (2013)

Um homem de pé diante de um computador de mesa; ao fundo, um espaçoso apartamento

Imagem: cena de “Her” (2013).

Ressalva. Em meados deste ano, assisti ao filme “Her” e durante a assistida, redigi algumas notas em um gravador de voz, a partir das quais eu gostaria de organizar uma crítica melhor organizada. Como o filme já foi bastante discutido, decidi que não valeria a pena tanto o esforço ― além de que as notas, como vocês verão, estão suficientemente estruturados, apesar da coloquialidade que não é comum na minha escrita. Por conta do filme ser bastante conhecido, me abstenho de qualquer introdução sua. Tentei deixá-las quase da mesma forma que foram transcritas automaticamente, somente com algumas adições e revisões de algumas expressões que o programa áudio-transcritor não conseguiu compreender bem.

Notas de voz sobre “Her” (2013)

Após 12 anos, desde o lançamento de “Her”, estamos cada vez mais próximos de criar um sistema operacional baseado em inteligência artificial. Então é a hora de discutir como poderia ser essa inteligência artificial.

Nas primeiras vezes em que lhe assisti, encantou-me a estética, sobretudo a fotografia e o setape de computadores que aparecem no filme. Todo o longa-metragem foi recebido por mim e por outros tecnófilos quase como uma espécie de futuro desejado.

A partir do atual estado de arte da sociedade e da tecnologia ― e sobretudo da inteligência artificial ―, outros lampejos me surgiram. Chamou-me atenção em especial em como é representado sua sociedade: inapta a expressar amor, necessitada de um redator profissional para redigir cartas afetuosas, uma necessidade provinda sobretudo de pessoas mais velhas. Além disso, há nesse cenário um fundo pouco explícito, mas hoje em dia conjecturável por conta das BigTech, no qual empresas lucram com solidão em massa.

Mas, por outro lado, vejo um ideal de relação entre tecnologia e seres humanos em “Her”: uma relação amigável, de acolhimento e de confiança, na qual o dispositivo é sobretudo uma ferramenta responsiva, ainda que tenha “sentimentos”.

Nota-se que a voz é o maior meio de orientar de comunicação com o computador, o que torna o filme mais envolvente. O som é um veículo mais acolhedor do que a visão, requer mais participação de quem tem contato com o veículo, o que faz todo o sentido no contexto do filme. Uma interface puramente visual tornaria o filme mais abstrato e menos envolvente.

Outra coisa também muito interessante sobre esse filme é que, apesar de ele ter sido feito em 2013, em um período da ascensão das redes sociais, quando redes como o Facebook e o Twitter estava em alta, o diretor preferiu não as citar. A maior parte do tempo, as personagens do filme falam em e-meios e mesmo o e-meio é um veículo de notícias, então eles têm a newsletter como um veículo de comunicação de massas também.

Essa escolha é lógica, eu creio que tenha a ver com o fato de que as redes sociais naquele tempo já eram um veículo muito abrasivo e, eliminando-as, a gente teria um filme mais cozy, essa coisa agradável, acolhedora, né? Sem tanta abrasividade, sem um cenário tão corrosivo que as redes sociais promovem.

Tem algo também que me incomoda muito nesse filme, que explica o seu sucesso entre os homens, é que da personagem protagonista, um homem sensível, feminino, não se têm suas fragilidades mostradas no filme; a gente não entende porque é tão rejeitado, como é que ele tem tanta dificuldade com a sua relação com as mulheres.

Um dos perigos que “Her” mostra certamente. Primeiro, que as empresas de tecnologia poderiam lucrar com a nossa solidão e com a nossa carência. Isso é indiscutível. Mas também relembra a importância de que, apesar da inteligência artificial, a gente mantenha a tecnologia em sua função de ferramenta, e não de brinquedo ou de meio de entretenimento. Afinal de contas, tudo no filme começa a desandar quando Theodore passa a se distrair com a “humanidade” sintética de “Samantha”, como é chamado o computador.

Acho que é importante também lembrar que Sam Altman designou uma IA sua, a partir do conceito de “Her”. Isso faz pensar sobre como a gente tem que cuidar com a própria gramática visual dos nossos filmes criticando da tecnologia.

Também percebo como algumas discussões são azeitadas no filme como, por exemplo, a questão da criatividade, não é? Em dado momento, quando o protagonista está em um passeio com seu computador, este compõe uma peça musicial que “combina com a situação”. Por nenhum no momento Theodore pensa sobre como a arte produzida por Samantha é sintética, sob quais parâmetros ela é designada.

Então há uma certa aceitação sobre a criação por um inteligência artificial nesse cenário. Porque também ajuda a promover a IA com uma coisa positiva, cria toda essa gramática visual de “tecnopositividade” e seduz as pessoas, inclusive, né? Azeita a crítica a respeito da tecnologia.

Eu gosto desse filme também por conta da relação agradável e azeitada com a tecnologia, mas também como ele promove a concepção de uma slow web, de uma slow tech, também por conta do e-meio ser o veículo principal de comunicação. Há sempre um momento para se receber notícias, e a IA percebe isso muito bem. Ela sabe o momento de dar certas notícias durante a interação, e isso também é positivo.

#tecnologia #cultura #notas


CC BY-NC 4.0Ideias de ChiricoComente isto via e-mailInscreva-se na newsletter