Notas costuradas

Foto da silhueta de alguns postes de luz contra a luz do final da tarde. No céu, degradês em lilás, amarelo e azul escuro.

Entardecer em Fortaleza. Foto minha.

Como ando meio sem ideia do que publicar, eis um compilado de postagens do meu microblogue Akkoma, conversas de e-mail, ivesdropes e outros fragmentos de pensamentos que não renderiam uma publicação, mas que valem a pena compartilhar, além de eventuais recomendações.

Sobre o estado das Ideias de Chirico

Com frequência tenho um desejo de escrever ― sem saber o quê. É mais uma vontade de escrever por escrever ― como se assovia em vez de cantar. Uma pena que não dá para fazer “estudos” com escrita, como se faz com pintura por exemplo, ou “improvisos melódicos” como com um instrumento musical. Às vezes o que quero é escrever só pelo prazer de linguagem.

Ter um blogue tem me ensinado que a visibilidade vem através do tempo, e não através de um só espaço, e que às vezes ela não apresenta sinais ― como curtidas e compartilhamentos. Blogar tem me educado a não desanimar quando as coisas publicadas não causam “ruído” de primeira.

O que interessa é você deixar pontes visíveis para a sua produção. Sejam hashtags ou hiperlinkagens, se há pontes, as pessoas vão circular por ali.

Veículo para vídeos curtos

Assistir a vídeos curtos pelo computador é dez vezes melhor do que assistir pelo telefone. Assim dá para dividir a tela em duas, deixar o feed em um lado, e outra aba em outro, onde se pode pesquisar alguma recomendação ou abrir algum perfil enquanto o vídeo roda. Acho também que assim me sinto menos preso. Recomendo bastante.

National rock

Nomes de bandas brasileiras de pop-rock ― meio desprezadas ― escritos em inglês soam como qualquer outra banda estadunidense que o povo paga pau por aí:

New Cloth;

Initial Capital;

Assassins Mamonas;

Urban Legion;

Hawaii's Engineers;

Red Baron;

The Success' Mudguards

Twenty Two CPM.

Please, come to Brazil ― and make money!

Estava ouvindo o pessoal do podcast mimimídias ― aqui o corte do episódio ― falando sobre a nova música do Offspring, Come to Brazil, e Clara Matheus falou uma coisa que faz sentido.

Uma vez que o público brasileiro engaja em publicações de gringos falando sobre o Brasil (essa coisa toda de Brazil mentioned), agora os artistas internacionais, caso estejam precisando de uma grana, na dúvida metem o nosso país em uma nova produção.

Essa música do Offspring por exemplo parece ser puro suco de turismo barato, coisa de quem só ouviu falar do Rio de Janeiro, de mulher bonita, caipirinha, churrasco, samba etc.

Ouvir o mundo falar do Brasil é legal, mas tem de se ver se é um movimento genuíno, de alguém que conhece o país, e se, afinal, não é uma forma de nos transformar em massa de manobra para descolar um cachê...

E-mail para o Professor Pasquale

Religiosa e diariamente acompanho “A Nossa Língua de Todo Dia”, programa da Rádio CBN que ouço via podcast, apresentado pelo lendário Professor Pasquale. Neste programa, Pasquale responde, de segunda à sexta, a dúvidas de gramática. Como forma de ilustrar as regras gramaticais, ele roda ótimas músicas ― ou, como ele chama, “auxílios luxuosos”.

Em meados de setembro enviei uma mensagem na qual, além de pedir a solução de uma dúvida, também comentei sobre outro boletim seu, cujo título era “É correto aplicar o plural em frases que citam o número zero?” ― aqui o episódio. Aí, Pasquale faz uma confusão sobre a ironia em construções, muito comum entre a juventude, do tipo “Tal notícia surpreendeu um total de zero pessoas”, aplicando a mais rançosa das gramáticas normativas.

No começo deste mês de outubro, Pasquale respondeu minha dúvida. Entretanto, por uma questão de economia de tempo, não leu o meu comentário a respeito de sua má interpretação sobre construções com “zero”. Como forma de pôr a discussão para frente, aqui vai o meu e-mail na íntegra:

Boa tarde, professor Pasquale e equipe CBN! Quem escreve outra vez Arlon de Serra Grande, aquele que enviou a pergunta do programa do dia 7 de junho, sobre o uso do verbo ser em “Deus é contigo”. Antes de fazer minha nova pergunta, gostaria de dar meus dois centavos sobre a dúvida/discussão levantada no programa do dia 29 de agosto, a respeito de expressões com “zero”.

Expressões do tipo “O evento recebeu zero pessoas”, “Estou estagiando com a remuneração de zero centavos” etc., são muito comuns entre a geração de cristal (também conhecida por geração Z) e pode entrar no rol das expressões figurativas, logo, não deve ser lida de modo literal.

Me explico: quem o diz provavelmente tem plena consciência de que as palavras seguidas de zero não são flexionadas no plural. Ainda assim essa pessoa o faz para enfatizar a ineficácia ou a frustração de um evento esperado. Tanto é que em geral, quando as pessoas falam essa expressão, sublinham-na com o tom da voz: “Eu estou ganhando duro e ganhando ZERO centavos por isso, acredita?”.

Há ainda outra expressão neste formato: “A nossa festa recebeu um total de zero pessoas”. Ora, quando se fala de “total”, fala-se de soma, mas a expectativa de que há alguma quantia somável é quebrada pelo “zero”, que é ainda enfatizada pelo plural cinicamente flexionado. Então, dito isso, defendo que essa construção de suposto desvio é consciente, fruto de sarcasmo.

À parte disso, gostaria de lhe perguntar sobre outra coisa. Tenho percebido que há uma série de palavras em LP terminadas em “bundo”. Sua significação é quase que intuitiva para o falante. Por exemplo:“furibundo” é aquele que está com fúria; “meditabundo” é aquele que medita, ou que está pensativo; “moribundo” é aquele que está por morrer. Não nos esqueçamos ainda do conhecidíssimo “vagabundo”, aquele que vaga, que é associado ao ócio.

Mas, afinal, de onde vem e o que significa esse “bundo” grudado nessas palavras? Por que há variações dessas palavras mais simplificadas, como “furioso” e “meditativo”? Faço essa pergunta porque sei que você é uma figura muito afeita à filologia (ciência também conhecida como linguística histórica ― cuidado para não pronunciarem “linguiça”, hein!), e dúvidas filológicas são difíceis de serem sanadas através da internet.

É tudo. Se não for pedir demais, gostaria de que mandassem um abraço a Yuri Bravos, grande companheiro da internet fediversal, também daqui de Fortaleza, e, assim como eu, ouvinte assíduo da Nossa Língua de Todo Dia.

Abraços!

Readymades de ônibus

Frases roubadas de pichações, conversas, telas de telefone ou outras quase-interjeições que ouvi/li enquanto tomava condução coletiva.

“Vivo isso, não disso”.

“Prefiro me vestir igual um mendigo do que ficar igual um mendigo depois”.

“Não tenha medo de peidar enquanto mija ― não há chuva sem trovão. Mas cuidado com o deslizamento de terra...”.

“Não estou dizendo nada, só estou falando”.

#cotidiano #notas


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