Notas costuradas
Imagem: @jonlord@mastodon.world
Longas notas desta vez. No entanto, não consigo vê-las separadas. Somente uma breve ressalva: a partir desta e das futuras publicações, estarei preferindo o complemento nominal “em linha” em lugar do anglicismo “online”.
Estudando “Estudando Poesia”
Se você acompanha a aba “Agora” destas Ideias de Chirico, viu que há alguns meses tenho trabalhado na autopublicação de um livro, o “Estudando Poesia”.
Que é o “Estudando Poesia”? Bom... é autoexplicativo, mas nem tanto. Entre 2014 e 2019, reuni quatro cadernos de escritos de poesia. Eram literalmente meu processo de aprendizagem da linguagem poética tradicional. Isto é, meu processo do domínio do verso enquanto veículo de poesia.
Durante o ano de 2014, estudei a forma soneto; no ano seguinte, a prosa poética; em 2016, pratiquei o verso livro, e daí em diante só aprimorei o que aprendi, até culminar em 2019 quando desisto de fazer poesia em versos. Fora o verso sem caixa alta, só de minúsculas, escrevi toda sorte de estilo e forma, inclusive descaradamente imitando autores de que gostava. Em 2020 então passei a me dedicar ao estudo de poesia concreta, encerrando o ciclo iniciado em 2014.
Eis que em 2021 participo de um curso de “Poesia Expandida” realizado em linha pela Casa das Rosas em São Paulo. Tratava-se de uma oficina de experiências coletivas com poesia transmidiática. Isso me proporcionou duas coisas: uma comunidade dedicada à poesia e ânimo para publicar um livro. Além de tudo, com as discussões dentro do curso e outras leituras que fiz durante o tempo, tive repertório suficiente para entender o meu processo de aprendizado poético.
Como somente os versos por si não seriam suficientes para o leitor compreender os meus objetivos e as minhas decisões, a cada caderno escrevo um “depoimento” falando a respeito das lições formais que tomei com cada padrão poético ― com quais temas cada um combina, que tipos de sensibilidade cada um proporciona. Além disso, também decidi escrever superficialmente sobre o momento pelo qual passava no momento da escrita, apenas a título de curiosidade. Assim surgia a ideia de “Estudando Poesia”, cujo nome ― entendedores já entenderam ― se inspira no título do antológico disco “Estudando o Samba”, de Tom Zé.
Em 2022 comecei uma épica campanha de arrecadação para a impressão do livro. Não utilizei nenhum intermediador além do banco e das redes sociais onde publicava a campanha; eu divulgava a notícia, conversava com pessoas que eu cria serem interessadas no livro e então todas as contribuições eram guardadas em uma conta bancária com pouco movimentação e anotadas em uma planilha.
Em 2024 já tinha o dinheiro suficiente para a impressão de 140 exemplares ― daí vocês tiram a ideia do quão caro é publicar livros. Nesse ínterim, tive de contatar designers, revisores de texto, outros poetas que poderiam me ajudar a desenvolver melhor o texto.
Até que nesta semana publiquei em meu outro perfil do Fediverso um vídeo da caixa de livros impressos, gravado pelo meu produtor gráfico, o Diego Dias, poeta e tradutor baseado em São Paulo. Exceto um detalhe na capa, resultado de uma má comunicação, o objeto saiu como esperado; toda a arte do livro, desde a capa até a diagramação foram designados ou desenhados por mim, com a execução da designer Barbarah Freire, também de Fortaleza.
Qual o próximo passo? Lançá-lo, claro. A minha ideia é de que o título seja lançado em dois momentos: o primeiro em um encontro em linha, outro em um encontro em algum lugar de Fortaleza. Quando? Durante o mês de dezembro. Ainda não tenho data precisa, mas imagino que acontecerá antes do Natal.
Como vocês podem ver na publicação linkada acima, estou dedicando dez exemplares para membros fediversais ou outros leitores destas Ideias de Chirico. Caso tenha interesse em adquiri-lo, me contate pelo e-mail no rodapé desta publicação.
As coisas como horas
Eu sei que a hora está entre 7h50 e 8h10 quando os homens da auto-oficina ao lado da minha casa começam a abrir os portões de dois metros; isso dá para ser ouvido do outro quarteirão. Também sei que são 9h quando a minha vizinha de baixo começa a bocejar gritando. Sei que são entre 5h20 e 5h40 porque é quando o sol fica da cor de laranja podre. Houve um tempo também que sempre às 17h um beija-flor rondava a minha varanda.
E se de repente tentássemos prescindir dos relógios?
Roteiro (provisório) para um estudo de línguas
Estudar línguas, depois da quinta aprendida, torna-se uma questão de compromisso e de planejamento. Gosto de todas as línguas, porque, de certa forma, gosto de todos os povos do mundo. No entanto, não posso aprender todas as línguas do mundo ao mesmo tempo ― quem me dera!
Como eu já aprendera o inglês e o espanhol, línguas básicas para um estudante interessado em progredir na carreira acadêmica; e como também aprendi o francês e o italiano, línguas básicas para alguém interessado em artes, decido partir para drogas mais pesadas ― línguas indígenas, línguas artificiais, línguas do mundo oriental.
Até meados deste ano eu estava dedicido a estudar esperanto no começo do ano que vem. Nada sério, apenas por curiosidade. Daí eu cairia de cara no chinês mandarim. Meu plano era aprender essa língua leste-asiática tanto por sua relevância no tabuleiro da geopolítica mundial, quanto por sua influência sobre a língua e a cultura do Japão; logo, aprender a primeira língua, facilitaria o aprendizado da segunda.
Foi o que aconteceu com a relação entre o inglês e outras línguas; o fato de eu conhecer a anglofonia, fez com que eu pudesse identificar várias palavras cognatas no francês e no italiano, língua que, como o inglês, recebeu muita influência da francofonia.
Porém há alguns dias percebi o quanto me encanta a Suíça. É da Suíça que vêm gente como o educador Jean Piaget, o arquiteto Le Corbusier, o cineasta Jean-Luc Godard e o linguista Ferdinand de Saussure, figuras que atravessaram minha formação.
Além disso, o francês suíço é, na minha opinião, o mais agradável da Europa (lembrem que o francês é falado também na América Latina e, sobretudo na África). Essa variante francófona também é comprovadamente mais lenta do que a parisiense, o que facilita no aprendizado. A minha principal referência de francês falado (além dos meus alunos africanos francófonos, é claro), é o professor Lucas, de Genebra, mantenedor do canal French Comprehensible Input.
Bem, e então pesquisando mais a respeito do país europeu, soube que é um território multilíngue, visto que tem fronteiras abertas com Alemanha, Itália e França, o que divide seu território em três partes: teutófona ao Norte, italófona ao Sul e francófona ao Oeste ― enquanto ainda conserva algumas regiões com falantes do patuá local.
Visto então que já sei italiano e um pouco de francês, por que não aprender também alemão, para, caso me encontre com um suíço nativo teutófono, não ficar esbabacado em um inglês improdutivo? E, para variar, a língua alemã também foi bastante influenciada pelo francês e tem alguns galicismos.
Além disso, gosto muito da música de concerto da Alemanha ― Bach, Beethoven, Webern, Schönberg; tenho alguma admiração por Stockhausen. No começo da juventude fui impactado pela obra expressionista da alemã Käthe Kollwitz e do austríaco Egon Schiele. Gosto da poesia de Rainer Maria Rilke.
Como se não bastasse todos esses motivos, ainda quero aprender o neerlandês, que dizem se parecer muito com alemão.
Por que então não aprender logo alemão de uma vez, já que essa é a trajetória comum de quem aprende línguas?
Decido que, quando dominar o francês, logo em seguida irei ao alemão. Espero que eu sobreviva às declinações e pronúncias rasgadas...
O cineasta suíço Jean-Luc Godard.
Por um minimalismo de baixo custo
Estou por criar o conceito de “minimalista pobre”. Sou contra o consumo e o ritmo de vida desenfreados. Mas também não sou otário de pagar 350 dólares por um telefone burro.
Há inclusive um adjetivo em português para designar algo ― um indivíduo, um estilo de vida etc. ― contido e disciplinado (basicamente o que resume todo o minimalismo): espartano. Segundo o dicionário em linha Infopédia, “espartano” é algo:
- de Esparta, cidade da Grécia Antiga; 2. (figurado) austero; sóbrio; 3. (figurado) em que há rigor, disciplina, firmeza e severidade.
Um ode à simplicidade tecnológica
Rodrigo Ghedin, do Manual do Usuário, em contraposição aos pomposos mouses “gamers”, faz loas ao seu mouse simples e barato.
• Meu mouse preferido custa menos de R$ 40 (Manual do Usuário).
Eu seria ainda mais radical: adoro usar o touchpad do meu laptop!
Quando mantenho os dedos indicadores nas teclas F e J, consigo confortavelmente manter os polegares no touchpad, perfeitamente alinhado a essas teclas. Isso me permite de fazer enésimas tarefas com a interface gráfica ao tempo que escrevo alguma coisa. Claro, digito com memória muscular, através do leiaute Dvorak.
• Como e porque passei a escrever com teclado Dvorak (Ideias de Chirico).
Além disso, configurei meu Xubuntu com atalhos que otimizem o uso do teclado e exijam menos distensão dos dedos. Isso faz com que, de qualquer forma, eu evite o uso de touchpad.
No entanto, há um recurso magnífico no touchpad que os mouses não possuem: rolagem horizontal. Esse recurso é particularmente muito útil porque costumo utilizar janelas um ao lado da outra, o que diminui sua margem. Logo, muita vez preciso ter acesso a uma informação que está omitida pelo limite da janela. Isso é uma mão na roda também para a navegação de planilhas largas, com muitas colunas.
- Prescindir o suficiente de mouse faz também com que eu possa utilizar o laptop em qualquer banda do mundo sem o menor problema ― a não ser o ergonômico, quando a máquina estiver sobre o meu colo...
A única limitação que vejo no touchpad é o uso de seu “botão do meio”. Em um touchpad a pressão simultânea de seus dois botões encarrega-se dessa função, ou ainda o toque com três dedos dentro de sua área tátil ― nesse caso, é necessário retirar os indicadores das teclas F e J, o que é bem inconveniente. A função de “botão do meio” é muito útil sobremaneira em sistemas Linux, porque através desse botão é possível copiar e colar um texto com apenas dois cliques.
Linkroll
Laura, professora madrilenha de espanhol para estrangeiros no Youtube, executou um incrível projeto de casa-van em estilo chalé. De dentro, o espaço parece imenso!
• Cottage Van Tour // Full Time Traveller (Spanish After Hours ― Youtube).
@elmoneto@mastodon.com.br tem mapeado os municípios brasileiros com mobilidade de tarifa zero, ou seja, onde se pode tomar ônibus de graça. Dentro desse sítio é possível filtrar o gráfico por gradação de população e por ano de implementação.
• Tarifa Zero no Brasil (elmoneto.net).
O podcast Escafandro, de jornalismo investigativo, fez uma cobertura sobre o que se sabe até agora de um projeto do Governo Federal para implementar um data center em uma região de pouca água da cidade de Caucaia, CE. O projeto é colossal e sem precedentes em território brasileiro, e o primeiro interessado a utilizá-lo não é nada mais do que a também colossal ByteDance, mantenedora do TikTok. Moro próximo de Caucaia, e nem de longe eu tinha ouvido falar desse projeto, que pode inclusive afetar povos indígenas e até elevar o custo da água nas redondezas.
• Um data center incomoda muita gente (Escafandro).
@ploum@mamot.fr fez uma bela resenha sobre o (mini)malista smartphone da Mudita, o Kompakt. O telefone tem não mais do que cinco polegadas e têm tela “papel”, como o Kindle. Além disso, não tem notificações por padrão e vem com uma chave de desativação total da rede. Como falei lá em cima, não tenho a coragem de, neste momento da vida, dar 350 dólares em um aparelho celular. No entanto, Ploum faz muitas boas reflexões de como se deve ser a nossa relação com nossas tecnologias.
• Une vie sans notifications (Ploum.net ― le blog de Lionel Dricot).
Imagem: Paul Noth
Citações
“A internet morreu”. Não, ainda não morreu. Se pensarmos na internet como um país tomado por latifúndios, há uma miríade de hortas comunitárias e jardins cuidados por prazer e lazer por aí. Por favor, não grite que só temos latifúndios.
aparentemente em francês “gasolina” é 𝓮𝓼𝓼𝓮𝓷𝓬𝓮 e fazer “fazer faxina” é fazer ménage
o q ja basta para comprovar minha tese q qualquer coisa na língua francesa parece ou q saiu de comercial de perfume ou q é safadage
A gente trabalha a semana inteira chega terça ta só o pó
― @apropriagui@masto.donte.com.br
toda vez que lança um novo iPhone eu lembro do cara que vendeu o rim pra comprar o iPhone da época. um iPhone 4. imagino esse cara hoje
― @Ze_Andarilho@capivarinha.club
Aparentemente o James Gunn disse que o filme do Superman não faz referência ao genocídio palestino e algumas pessoas estão chateadas. Como que uma pessoa vai assistir a um filme de uma megacorporação e espera deles nada além de realismo capitalista? A gnt pode interpretar o filme como quiser, mas sabemos que intenção jamais é ser realmente revolucionário. Toda crítica que nasce do capitalismo contra ele mesmo nunca é realmente revolucionária
Un idiome se définit moins par ce qu'il permet de dire, que par ce qu'il oblige à dire. (...) Mais la langue, comme performance de tout langage, n'est ni réactionnaire, ni progressiste; elle est tout simplement : fasciste; car le fascisme, ce n'est pas d'empêcher de dire, c'est d'obliger à dire.
― O crítico literário Roland Barthes em sua antológica aula inaugural de 1977 ― que ainda quero traduzir para estas Ideias de Chirico...
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