Felipe Siles

Espero que seja útil

Dia 1° de maio, dia do trabalhador, de lutas, de reflexão. A despeito desse importante fato, as elites globais do atraso não se cansam de praticar cinismo e tentam operar um verdadeiro golpe publicitário bem nessa data histórica. Pra quem perdeu esse tragicômico e discarado episódio da história da internet brasileira, a Google estampou com todas as letras embaixo do seu buscador: “O PL das fake news pode aumentar a confusão sobre o que é verdade ou mentira no Brasil”. O link cai em um artigo curto do blog da própria Google cheio de inconsistências e suposições abstratas, com um link para outro artigo mais longo e detalhado, do mesmo autor. Basicamente a Google sentiu o golpe e, no desespero, apelou por uma prática abusiva, já denunciada pelo Ministro da Justiça Flávio Dino.

Quem é da bolha tech, gosta do mundo opensource, linux, ou simplesmente se interessa pelos impactos da tecnologia na nossa vida já percebia há muito tempo o efeito prático nocivo das plataformas: desde uma aparente correlação entre Instagram e aumento da depressão e suicídio entre adolescentes, até mesmo à influência direta de conglomerados como o Facebook em decisões políticas importantes para o planeta, como o Brexit e a eleição de Donald Trump nos Estados Unidos. Com o passar do tempo tudo foi ficando mais cristalino... veio o Facebook Papers... até alguém um pouco mais desavisado percebeu o problema em documentários como “Dilema das redes”, que pode ser assistido no poderoso conglomerado Netflix. E foi ficando mais nítido, quando Elon Musk comprou o Twitter e começou a agir como o dono da bola mimado, tomando decisões completamente arbitrárias em sua rede, como por exemplo trazer de volta o ex-presidente Trump, que havia sido punido por violar as regras da plataforma.

Até então esse assunto era concentrado em nichos muito específicos. O próprio Twitter, no Brasil, é um nicho também, possui menos usuários ativos por aqui que o Pinterest, por exemplo. Mas alguns fatos vieram à tona e furaram a bolha: tivemos 4 anos de um governo fascista e negacionista disseminando fake news e sendo investigado por diversas CPIs, como a da COVID. Tivemos a invasão dos três poderes em Brasília pelos “patriotários”, numa tentativa de golpe de estado anti-democrática, reprovada por maior parte da opinião pública. E, mais recentemente, voltaram aos noticiários os casos de ataques em escolas, causando um verdadeiro pânico moral em praticamente toda a população. A extrema direita brasileira costuma ser muito boa em mobilizar esse tipo de pânico em cima das “nossas crianças”, mas parece que nesse assunto em específico eles possuem dois calcanhares de Aquiles: o fetiche pelo armamento e a dependência da máquina de fake news que patrocina facebook, instagram, google, twitter e cia.

Pela primeira vez em muitos anos o assunto de como as plataformas afetam diretamente a nossa vida chegou de verdade na maioria da população. Podemos questionar o sensacionalismo e o pânico moral decorrentes dos ataques na escola, mas é inegável que ele produziu um efeito na maioria das pessoas, que tem filhos, parentes ou filhos de amigos nas escolas. E também é a primeira vez que temos no Brasil um esforço institucional para colocar algumas regras nessa terra sem lei, que é o oligopólio da internet pós-zuckberg. Os pais começam a se preocupar com o que os filhos consomem nos chats do Discord enquanto jogam, com o que consomem na internet, no geral. E quando uma empresa gigante como a Google se coloca contra uma PL das Fake News, passa o recibo até para o cidadão comum.

Pelo que fiquei sabendo, esse assunto da Google e a PL chegou até o Jornal Nacional. A bolha tech foi furada, finalmente. Nunca estivemos tão próximos de uma legislação que vai começar a abrir uma pequena fresta na merda em que estamos afundados. Eu não me lembro, em nenhum outro momento, de ver uma ação desesperada como essa da Big Tech, aqui no Brasil.

É hora de falar com absolutamente TODO MUNDO sobre esse assunto! E não é fazer postizinho do instagram, promovendo o auto-engano de que fez a sua parte. É puxar assunto com cara aleatório na padaria, é falar com parente, com vizinho, com amigo do trabalho sobre o assunto. É fomentar o debate FORA DO AMBIENTE DAS BIG TECHS: na padaria, no boteco, em casa, no trabalho, na escola, na faculdade. É começar a sugerir outros aplicativos para a galera, de chegar com dados consistentes que mostrem para as pessoas todo o mal que a big tech opera sobre nós nas últimas décadas. É pegada estilo “vira-voto 2018” mesmo, precisa da mesma mobilização, ou até superior, já que estamos num momento tão ou até mais importante do que aquele.

Não sabemos se teremos outra oportunidade como essa, não vamos desperdiçar...

Espero que este texto tenha sido útil, até a próxima!

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